CONSULTANDO O PROFESSOR (Que o Médico escritor Marcelo Caixeta analise isto)
Foi apenas um pequeno desastre, fui ao chão com a moto para não aturdir um “bicicleteiro”, contive as duas rodas bruscamente, e o asfalto molhado não aderiu. Sentindo muita algia no ombro direito, tive medo de ter quebrado a clavícula, então fui rápido ao Hospital de Acidentados em Goiânia. Que atendimento de primeira linha, naquele pronto socorro! Com a carteirinha do "ipasgo" em mãos, tudo fluiu bem. Lembrando que naquele momento eu estava inadequado para analisar qualquer situação, a dor entorpecia minha razão, mas enquanto esperava o laudo referenciado na chapa de radiografia, na sala de espera, conversava com outros acidentados sobre a fragilidade da vida humana.
Pronto, chegou minha vez, o Médico chamou-me para as considerações finais. Ele me informou que não tinha fratura e nem luxação, foi apenas uma contusão. Então me fez uma receita recomendando um anti-inflamatório, aproveitei e lhe pedi um atestado para justificar minha ausência na Feira Cultural da Escola, que estava acontecendo naquele exato momento. Até aí nada de admirável, o terrível foi quando ele me perguntou:
— Em que você trabalha?
— Sou Professor de Língua Portuguesa – respondi meio entusiasta, pensando na equiparação do dialogo, pois até então, só tinha recebido ordens e conselhos.
— Então merece! – expressou-se o Médico com um ar de impassividade.
Passaram-se alguns segundos, enquanto me reconstituía a fala, e ele terminava de redigir o atestado; olhando sua escrita disforme e ilegível, elaborei uma suposta vingança. Quebrei o silêncio assim:
— Sabe, Doutor, meu sonho era ser Médico, hoje estaria concorrendo com você!
Essa seria a única resposta, a meu ver, que se encaixaria nas duas intenções de sua expressão obscura. Se ele estava querendo me dizer que eu “merecia” porque não tinha acontecido nada grave no acidente, então estava se mostrando simpático, por isso meu “concorrendo” equivalia valorização: colegas de igual nível trabalhando juntos. Agora se o seu “merecia” estivesse significando um “bem feito” porque ele não gostava de Professor de Língua Portuguesa; então o meu “concorrendo” prenunciava um massacre por nossas diferenças linguísticas.
Se eu não o entendi, e se ele não me entendeu, foi uma consulta sem comunicação, contudo não deixou de vale à pena a preocupação com nossas relações profissionais.