CAOS CRIATIVO

Nunca fui um primor de dona-de-casa. Isso tem origem lá na minha infância, quando subia em um banquinho para lavar a louça e minha mãe dizia: “ – Deixa que a Rosa (nossa doméstica) faça isso. Você pode quebrar alguma coisa”.

Já na adolescência, quis me aventurar na cozinha, bancando a “mestre-cuca”. Algumas vezes, minha mãe até deixou que eu arriscasse algumas gororobas, mas quando quis de fato aprender a cozinhar, ela me disse: “ – Filha minha não nasceu para ser dona-de-casa. Pega os livros e vá estudar”. Claro que desenvolvi verdadeira aversão aos serviços domésticos. Em contrapartida, adquiri um amor aos estudos, leituras e escrita, tanto é que o resultado é que hoje compartilho um pouco do meu ponto de vista neste espaço. O fato, porém, é que nunca é demais saber um pouco de cada coisa. O que ficou incutido na minha mente, desde a mais tenra idade, é que não seria capaz de fazer alguma coisa sem quebrar algo ou me machucar. E que meu destino reservava algo diferente do que achava que de fato seria para mim. Não adiantaria dar murros em ponta de faca.

Mas, por algumas das ditas ironias do destino, minha mãe faleceu aos 33 anos, quando eu – então – contava com 14 anos recém feitos. Aos 18, já na faculdade, resolvi morar sozinha. Nem preciso dizer que minhas primeiras experiências como dona-de-casa foram verdadeiros desastres. Manchei algumas roupas ao lavá-las com alvejante, queimei arroz e há pouco tempo atrás é que aprendi a cozinhar feijão! Até então não precisava fazer, mas se tivesse, ao menos, tido a oportunidade de errar quando me dispunha a aprender, certamente não teria passado por tantos apuros.

Não estou, contudo, condenando a atitude de minha mãe. Ela realmente queria que eu tivesse uma vida diferente, quiçá melhor do que a dela. O fato é que quando somos crianças, o que nossos pais ditam se torna lei, criam-se alguns convencionalismos e vícios que se tornam difíceis de modificar. Ainda hoje estudo muito, sempre fazendo cursos e especializações. Trabalho mais ainda, sempre envolvida em mil projetos, mas como dona-de-casa sou falha. Meu escasso tempo e aversão pelos serviços domésticos criam um verdadeiro caos em meu apartamento. E nada tem a ver com o título acima. Não me sinto bem um ambiente desorganizado, e não entendo como algumas pessoas dizem que precisam da bagunça para desenvolver a criatividade. Estou mais adepta, então, para a teoria do caos: as coisas, às vezes precisam sair de ordem para que se reorganizem da melhor maneira possível. É claro que minhas roupas não retornam sozinhas para o armário, nem a louça se auto-lava. Mas quando sinto que preciso dar uma parada para fazer esse tipo de trabalho, apesar de relutar, acabo cedendo e fazendo o que é necessário. É como remédio amargo: você sabe que o gosto é ruim, mas não toma para agradar o paladar, e sim para curar algum problema de saúde.

Cresci, moro sozinha, ainda não me casei e nem tenho filhos. Não é questão de opção permanente, mas tão somente a escolha por outras prioridades de ordem maior. Tento segurar o tempo nas mãos. O infeliz não me obedece. Mesmo assim, sigo minha vida fazendo o que acho que é necessário – mesmo que possa quebrar alguma coisa ou me machucar. Na verdade, o caos criativo mora em mim, na minha cabeça!

Patrícia Rech
Enviado por Patrícia Rech em 05/09/2009
Código do texto: T1793744
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