OS VESTIDOS PERDIDOS

Até que enfim encontramos a casa que tanto queríamos: ampla e arejada, edificada em um grande terreno arborizado com várias espécies, inclusive as frutíferas, além de um belo jardim, como sempre fora o meu sonho desde criança quando ia à casa de minhas tias. Agora ele estava ali à minha frente, inteirinho meu. No interior da casa há grandes salas e quartos espaçosos com janelas para a varanda lateral ( esqueci de mencionar que a casa é avarandada em todo o seu exterior). A copa-cozinha lembra a das grandes mansões descritas nos romances,

Estamos morando aqui há pouco tempo e minha família resolveu organizar uma festa para receber, na nova casa, os parentes e os amigos mais íntimos. O corre-corre dos preparativos deixa as pessoas agitadas, preocupadas para que tudo esteja perfeito nos seus mínimos detalhes. É uma azáfama infernal que me causa atordoamento, e, para fugir um pouco do burburinho, resolvo escolher a roupa que usarei logo mais. Vou então para meu quarto, abro o armário, uma linda peça de jacarandá, em busca do meu vestido preto de tafetá “tomara que caia” e o respectivo bolero rosa com aplicações de renda, mas não o encontro. Opto pelo cinza, de seda, com o corpo todo bordado em “Rechelieu” (aquele que minha madrinha fez para meu aniversário) e também não o encontro.

Nossa, que arrumação o pessoal fez nesta casa, que não consigo encontrar nada? Verifico nas gavetas da cômoda e lá não encontro o que procuro. Ah!... acho que minha irmã deve ter pego alguns dos meus vestidos! Vou ao quarto dela, porém lá não os encontro. Volto a procurar no meu quarto inutilmente. Lembro então do vestido de cambraia de linho azul, de corpo justo abrindo-se em nesgas vazadas por renda, formando uma ampla saia. Nada! Também aqui ele não está. Parece que minhas roupas sumiram de repente, num passe de mágica. Nem o vestido vermelho, com frisos brancos, nem o lilás, nem o estampado com miosótis e nem mesmo aquele verde, do qual não gosto muito, mas que em último caso serviria. Já estou desapontada e alguem grita na porta do quarto para eu me apressar, pois os convidados já estão chegando, Estou a ponto de chorar e sem alguem para me ajudar nesta situação.

Vó, você está bem? Você estava resmungando tão aflita, está bem mesmo? (era a voz de minha neta com quem divido o quarto). Sim querida, estou bem. Foi só um pesadelo, coisas de velha, durma tranquila, boa noite.

Estou sentada na cama e ainda permanece em mim aquela sensação frustante de quem não encontra o que tanto e tão ansiosamente procura. Aqueles vestidos ficaram perdidos no tempo e só existem agora no velho baú de minhas lembranças. Ah!, ia esquecendo, a casa também.

Lucilia Cavalcanti
Enviado por Lucilia Cavalcanti em 04/09/2009
Reeditado em 29/09/2009
Código do texto: T1792488
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