PRETO NO BRANCO

Zé do Cornélio era um lapa de crioulo, beque do time do Cedro e tocador de tuba na banda de música local, vizinho da minha saudosa Vó Féla.

Forte que nem um touro, o Zé do Cornélio todavia era manso e pacífico, uma boa alma, amigo dos amigos, benquisto na vizinhança e, de resto, em todo o lugarejo.

Casou-se com a Dona Lourdes, funcionária do Grupo Escolar, e logo constituiu numerosa prole, fiel ao mandamento bíblico do “crescei e multiplicai-vos” ! ...

O tempo passou e o Zé do Cornélio, sempre muito correto, foi tocando a sua vida, sua tuba e criando os seus filhos na pacata cidadezinha do interior mineiro.

Zé do Zito, um sujeito claro, do olho azul, abriu pequena loja de calçados no Cedro e foi aquela novidade, pois antes dela o povo só podia comprar sapatos ou na vizinha Paraopeba ou em Sete Lagoas.

Mas esse negócio de comércio requer habilidade, paciência e bom trato à clientela, todos sabem. Menos o Zé do Zito , o qual, como seu pai, velho caçador do lugarejo, um bronco, tratava seus conterrâneos com casca e tudo.

Uma tarde, Dona Lourdes passou na sapataria. O marido dela fazia aniversário e ela queria presenteá-lo com um bonito calçado.

Escolhe daqui, procura dali, ela foi ficando cada vez mais indecisa. Zé do Zito descia caixas e mais caixas das prateleiras e Dona Lourdes não se resolvia.

Aí o comerciante perdeu a paciência, aproximou-se da cliente enquanto ela examinava mais um par de sapatos e indagou, ríspido:-

“- Como é, Dona Lourdes? O que vai ser?”

“- Ah, seu Zé do Zito, estou em dúvida a respeito deste calçado.”

“- Pode levar sem susto. Pra preto tá bom demais!” - arrematou o infeliz vendedor. Dona Lourdes pegou o embrulho, pagou e saiu assim meio contrariada. Foi direto pra casa.

Quando o maridão chegou do trabalho na fábrica, ela entregou-lhe o presente mas fez questão de comentar a observação imprudente, a tal de “pra preto tá bom demais”, feita pelo Zé do Zito.

Zé do Cornélio fechou a cara, guardou o presente, botou a camisa aberta no peito e saiu sem dizer o seu destino, enquanto a mulher punha a mesa para o jantar.

Em questão de minutos, adentrou a loja do Zé do Zito, fuzilando:-

“- Zito, como é mesmo o negócio do sapato pra preto?...”

O outro tentou balbuciar, mas não teve tempo:- um potente direto do Zé do Cornélio explodiu bem no meio das suas fuças, arrebentando-lhe os óculos em pleno rosto e jogando-o contra as caixas de calçados no fundo da loja.

Em seguida, o Zé girou nos calcanhares e voltou ligeiro pra casa, onde a família o esperava para a janta, nem se dando conta do que havia ocorrido!...

RobertoRego
Enviado por RobertoRego em 03/09/2009
Reeditado em 10/01/2015
Código do texto: T1790549
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