RITINHA TEIMOSA

A Ritinha, desde menina, era espevitada, arrelienta e danada de teimosa. A mãe falava, o pai ralhava mas ela só fazia o que lhe dava na telha. De tão insistente que era nas suas vontades, ficou conhecida no pequeno lugarejo do Tabuleiro Grande, onde vivia com família numerosa, como “Ritinha Teimosa”.

Nas festas juninas, a Ritinha brigava com o Mané Fogueteiro, dizendo:- "- A festa é aqui em baixo, por que tem de soltar foguete no céu, lá em cima?..."

O tempo passou, a Ritinha cresceu, passou de menina a moça, de moça a mulher feita, casou, teve filhos, teve netos e foi costurando a sua vida, como quem tece uma enorme colcha de retalhos, sempre acrescentando um pedacinho aqui, outro ali, formando uma grande manta multicolorida.

As coisas iam se modificando, com o passar da areia na ampulheta do tempo, mas o temperamento da Rita não mudava jamais:- a teimosia, sua principal característica, continuava cada vez mais forte.

Após alguns anos de luta, em face de uma doença nos rins que acabou se complicando, a Ritinha morreu, deixando viúvo inconsolável, filhos e netos saudosos e toda a comunidade do Tabuleiro Grande entristecida com o seu desaparecimento.

No dia do velório a casa se encheu de parentes, amigos e conhecidos. O cafezinho era farto, os biscoitos também, uma cachacinha pura corria entre os afeiçoados, meio que discretamente, acompanhada duma farofa de carne seca que forrava o bucho da rapaziada.

Lá pelas quatro horas da tarde, o caixão simples foi fechado e o povo principiou a caminhada rumo ao cemitério do lugar, distante uns três quilômetros da casa. Passaram por um pasto onde as vacas pastavam sossegadas, até chegar à beira do rio, onde teriam que atravessar uma ponte estreita.

Na travessia, um dos amigos que segurava uma alça do caixão, já bebaço, tropeçou e caiu, fazendo com que a tampa do esquife se abrisse e o corpo da Ritinha despencasse no leito do rio que corria agitado, alguns metros abaixo.

“- Virgem Maria, a Ritinha caiu no rio! Acode, gente! ...” , gritaram assustados.

Largaram o caixão aberto no meio da ponte e correram para a margem do rio, todos à procura do cadáver da falecida.

Nisso, o preto Cornélio, compadre da morta, começou a subir a margem do rio em sentido oposto, no que foi indagado pelo pessoal que descia, seguindo o curso da correnteza:-

“- Compadre Cornélio, o que vosmecê tá fazendo? Ela desceu foi por aqui! ...”

“- É, eu sei, mas ela era teimooosa, né mesmo? ...”

RobertoRego
Enviado por RobertoRego em 01/09/2009
Reeditado em 15/07/2015
Código do texto: T1787190
Classificação de conteúdo: seguro