FALSO BRILHANTE
Para encontrá-lo vou falar de amor e do que vivi, ainda que haja tantos perigos na esquina. A música diz que nossos ídolos ainda são os mesmos e as aparências não enganam não. E depois deles? Eu diria, dela. Não apareceu mais ninguém tão talentosa.
As sensações daquela noite permanecem intactas. A euforia era tamanha que meus amigos e eu, simplesmente, não suportávamos esperar nossos pais. E fomos na frente.
Ele estava na calçada, próximo à bilheteria com outro grupo. Entre risos e beijos, cabelos desalinhados, parecia descobrir o sentido dos braços, lábios e voz. Alguém perguntou sobre paixão. Ele disse algo sobre um novo interesse qualquer. A ferida era recente demais.
O cenário do encontro? São Paulo, 1976. Show "Falso Brilhante", de Elis Regina, quase um ano e meio em cartaz.
Há quanto tempo a inquietude deixou o Brasil?
Elis lançava compositores talentosos. E mistérios atuais ou desvendados, à parte, ele está entre os grandes e sua música vibra na voz da maior intérprete que este país conheceu.
Será isso amar o passado e não ver que o novo sempre vem?
Onde encontrar quem nos trará uma nova consciência e juventude?
Penso no Brasil das promessas e decepções. No Brasil sem memória. Em caras pintadas, hoje tão caladas. É preciso coragem para encarar a realidade, jogada todos os dias para debaixo do tapete.
Escrevo ao som da canção. Tenho vontade de gritar que minha dor é perceber que apesar de termos feito tudo que fizemos, ainda somos os mesmos...
Repiro fundo. Aquela noite no teatro ficou na parede da memória.
E como nossos pais, ele também estava lá.
(*) Imagem: Google
(*) Frases em itálico: Letra da música "Como nossos pais" - Belchior.
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