Uma bandeira contra a injustiça

Tenho o hábito de guardar pequenas coisas que marcaram meus sentimentos e fases da vida. Esse costume tem duas pernas: uma é guardar e a outra é rever. Assim, de vez em quando estou andando entre as lembranças e ruelas das memórias. Em cada um desses caminhos, que volto a passar quando revejo bilhetes, fotos e anotações, acabo revivendo quase as mesmas sensações e emoções. Quando são doces e agradáveis, sinto a vontade de prender-me dentro delas como em becos sem saída desejando ser como um personagem de uma foto e dela não mais sair.

Entre estas lembranças há um bilhete escrito pela minha primeira filha quando mal desenhava as letras e ajuntava-as formando frases. Esse recado dela me põe num beco de tristeza toda vez que leio, levando-me a sentir pena de mim mesmo. Direta nas palavras como flechas atiradas por um campeão, ela queixava-se das injustiças sofridas pelo pai ao discipliná-la e julgar suas atitudes entre ela e a irmãzinha.

As poucas linhas em papel rasgado de um caderno não têm exemplos nem argumentos, mas apenas um protesto, como uma bandeira ou um grito contra atos tidos como sem razão. Lembrar-me do que pratiquei não consigo, mas esquecer do sentimento amargo destilado naquelas curtas palavras, não posso. Mente fraca tem aquele que é injusto, mas lavrada em pedras são as lembranças de quem sofre a iniquidade.

Senti que o amor conhece a tristeza quando encontra a injustiça. E provei este acre no bilhete de quem deveria ser alvo de amor e não de ferida. Porém, a impiedosa Dona Injustiça veste-se de muitas formas e frequenta qualquer casa e família; come nos casebres e nos palácios. Para ela, não importa onde e como está, mas sua sede é de transformar a força em desânimo e rir-se ao ver apodrecer a semente das gerações que uma família pode gerar. Orgulha-se de induzir as pessoas a crerem somente na sorte e no acaso, ao invés de se firmarem no caráter e na bondade.

Somente à luz da cruz e arrependido posso sentir paz e ter a certeza de que estes atos não foram guardados por Deus e não serão postos diante de mim no juízo como o bilhete que de vez em quando está diante dos meus olhos como lembrança daquele tempo. Não vou rasgá-lo, pois cada vez que o vejo, minha disposição contra a injustiça ganha ânimo para que eu não me conforme com essas atitudes em lugar algum, muito menos na minha família.