Crônica do fim de agosto
Crônica do fim de agosto
“O que eu tinha a dizer já foi dito/por muito verso bonito/de muita gente legal.”
“Apegos são os anexos (...) Acabar com a consciência de meu é acabar com todas as escravidões. Considere-se apenas um tutor de tudo que lhe é dado em confiança."
“Gosto da regra que corrige a emoção. Gosto da emoção que corrige a regra”.
Três citações para começar e que vem a calhar. Calham as citações. Estavam próximas, vieram anteontem, ontem e hoje. Por que não compartilhar? Dois palitos e veremos a primavera chegar. Ela chega em setembro e vai embora em dezembro. Se você tivesse entrado no parque pelo obelisco, veria uma mulher gorda sentada numa beirada. Moradora do local, expatriada. “Quem passa nem liga já vai trabalhar. E você minha amiga, já pode chorar”. Citações não faltam. Expatriados idem. O amigo Brandi me revela em e-mail que apesar de terem censurado uma música do Gabriel Pensador, (que veio em anexo), não o impediram de pensar. Só por hoje, penso eu, às 9 da manhã. Longe de ser uma peça maior do Pensador, é antes de mais nada um bom retrato da função do artista. A música expressa que a fome e a miséria são frutos da corrupção e que as seguintes categorias profissionais deveriam estar atrás das grades. Bem, começaram a censurar. Resta saber não o que vem depois, mas quando.
Sucessão de belos dias ensolarados depois de um festival de umidade que torrou a paciência dos que saltam poças para não enxarcar os pés.
Na esquina da Brigantonio com a Santos, às 10 horas, um mendigo cantarola: “Oxalá, meu Pai, tem pena de mim Senhor, a volta do mundo é grande, seu poder é bem maior”. Escrito assim não sei como soa, mas ele fazia num lamento risonho, com melodia. Alguém, em algum tempo, compôs: “prefiro ser mendigo que ladrão”. Nesse fim de agosto, difícil saber para onde o vento está soprando. Quem tem algum conhecimento e um pingo de simancol já sabe que a melhor máxima é “só sei que nada sei”. Quem ainda não sabe nada ostenta no rosto a serenidade da ignorância. Curiosamente, os dois estados chegam em locais semelhantes. Pelo menos aparentemente. E afinal de contas, o que é que importa?
Pesquisadores, exaustos depois de pesquisarem sobre culturas em extinção, revelam que todas tem 4 caminhos básicos para se alcançar a graça: cantando, dançando, contando histórias, praticando o silêncio. Deveriam ensinar canto e dança aos que legislam arbítrios levianos, para que um dia praticassem o silêncio e então ouvissem as histórias dos que sofreram com seus desatinos. Tudo pela evolução. Seria brando, seus olhos se abririam e a fada do fim de agosto, com uma varinha de condão, lhes diria num sussurro quase melódico: “Oxalá, meu Pai, a volta do mundo é grande, seu poder é bem maior”.