LUZES DA RIBALTA

Estávamos na década de cinqüenta e todos os fins de semana eu e minha mãe íamos ao cinema. Naquele domingo iríamos assistir "Luzes da Ribalta", filme do memorável "Carlitos" (Charles Chaplin). Minha mãe, que estava muito gripada, resolveu não sair de casa, pois o tempo estava chuvoso. Troquei de roupa e minha mãe observou que o decote de minha blusa estava muito acentuado, no que concordei e fui buscar no "porta-jóias" um broche em forma de um pequenino punhal, que havia recebido de presente, cujo minúsculo cabo tinha as cores do meu time preferido. A pequena jóia media cinco centímetros, mais ou menos, do cabo à ponta e era ideal para fechar um pouco o meu decote.

Cheguei cedo ao cinema, pois não gostava de entrar com a sala já repleta, pois arriscava-me ficar sem o lugar de minha preferência. Escolhi calmamente e não muito a frente, sentei-me na primeira cadeira de uma fileira. As pessoas foram chegando, ocupando apressadamente seus lugares e quando as luzes se apagaram, para o início da projeção, alguém sentou na cadeira vaga à minha direita. Não reparei quem era, se homem ou mulher, pois estava somente interessada na tela.

Depois de serem exibidos os anúncios costumeiros e projetados as notícias com imagens quase sempre de políticos, começou o filme e fiquei completamente absorta, até que, quando lá pela metade da seção, senti que alguém colocava de mansinho a mão em minha coxa e aos poucos ia pressionando. Ao sentir aquela mão e a respiração ofegante de quem estava ao meu lado, foi que percebi que era um homem.

O sangue me subiu às faces e um frêmito de prazer me percorreu todo o corpo. Fiquei atônita com a reação física que estava sentindo e naquele momento pensei: AH! Se ainda fosse o meu vizinho! mas numa reação, mais de medo pelo que estava sentindo do que por revolta pelo atrevimento daquele desconhecido, retirei o broche que segurava o meu decote e cravei-o, com fúria naquela mão ousada, puxando-o em seguida com o mesmo ímpeto. O intruso soltou um gemido abafado de dor, levantou-se e saiu apressado.

Fiquei tensa, sentindo ainda o calor daquela mão que pressionara a minha coxa e não sabia precisar se meu desespero era porque fui molestada ou por causa de minha reação intempestiva que cortou abruptamente aquele quase prazer pelo inusitado contato.

No dia seguinte, já refeita e quase esquecida do ocorrido, ao sair para o trabalho, encontrei com o meu vizinho com um curativo, justamente no dorso da mão direita.

Lucilia Cavalcanti
Enviado por Lucilia Cavalcanti em 26/08/2009
Reeditado em 29/09/2009
Código do texto: T1775958
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