10% que me mata
Por volta das dez da noite deixei o trabalho para trás, não estava cansado, ainda havia fôlego em mim, o dia não foi lá essas coisas. Firme, caminhava pela rua tentando relembrar um bom bar para tomar uma cerveja geladíssima e depois encerrar quem sabe nos braços de uma alguma garota como, eu, assim também perdida. Na lista dos bares mais freqüentados por mim, tinha: A Lanchonete Estrela, em frente ao Teatro do Parque. É um bar ótimo e tem um balcão maravilhoso. Um bar com balcão vale por dois. Mas para essa noite não. Eu queria uma coisa nova. O Outro bar da lista era o Iraq, se bem que não é um bar e sim uma residência de artistas plásticos. E também a casa de um amigo meu, Evandro, mais o Iraq é longe paca, e eu tinha que ter duas coisas. Uma era coragem e a outra disposição para atravessar a cidade aquela hora. Por último o bar do Timão, um bar recomendado para todo Corintiano que se preze. Mas eu sempre estou por ali. E nessa semana foi o lugar que mais visitei. Fui ali mais vezes que a minha própria casa.
Ruas desertas, só os ônibus nas principais passarelas, mas ônibus e carros não é gente, não conta como um bom movimento. Do nada me deu um estralo – ah! Tem um bar na Rua do Bar Central – esse citado por último, O Central, é o bar da moda agora. Onde quem ganha dois salários, anda de táxi, só se preocupa com a demora da cerveja e tem muito o quê gastar, costuma ir. Para mim é um bar todo controverso. Muito chique, organizado, muito assunto de trabalho: estou ganhando isso; eu fiz isso; fechei negocio para; estou trabalhando com.
Também lá todo mundo parece bonito, bem arrumado, banheiros limpos sem ter nada escrito nas portas, sabe aqueles detalhes infames? Eu adoro, e a primeira coisa quando que num banheiro de bar – quero chupar seu pau, fone; Joca teve aqui 21.5.2005; quem ler isso é porque é frango; procuro por garotas sacanas e jovens; a torcida da Inferno Coral ou a Jovem ou Fanautico é o terror. Detalhes esses muito peculiares. Mais o que mais acho de controverso nesse bar é a cerveja. Servida como long-neck, é assim que se escreve? Mas popularmente eu as chamo de Securinha, porque quanto mais à gente bebe essa porra ficamos com mais sede e mais vontade. Enfim. Após atravessar uma avenida vazia chego a tal rua. De uma calçada a outra gente que Deus dava, lotada de muitos burburinhos, eu via uma população falante e seca. Essa foi à primeira impressão que tive da rua do bar Central. O primeiro bar que vi estava lotado, muitas pessoas alegres por causa do efeito massivo do álcool, todas sorridentes e bonitas. Muitas moças bonitas de variados tipos: gordas, baixas, magras, altas com belas pernas, cabelos black power, raspado – agora é uma tendência de muitas moças daqui do Recife raspar a cabeça – cabelos cacheados, compridos, com um corte chanel, hipongas, punks, moderninhas e outras normais. Mulheres para todas as torcidas. E alguns homens também. Sempre tem um presente que gosta do babado, mais aí fica a critério dele relatar as formas másculas prediletas.
Entrei no bar Ponto de Encontro e pergunto a um homem beirando os quarenta que soa rios pela testa – quanto é a cerveja mestre? Sempre chamo os mais velhos de mestre, foi um costume que habituei de uns tempos para cá e nunca mais parei de falar – R$ 3,30 – falou me olhando sério. Achei o preço absurdo, decidi usar umas das filosofias do capitalismo, a lei da oferta e da procura. Fui a outro bar, Encontro dos Amigos que de amigo não tinha nada e a cerveja custava R$ 3,50 ainda mais era Skol, uma amizade dessa não quero para mim. Vocês devem estar achando que sou pirangueiro, mão de vaca, mais não. Eu tomo todos os sábados ali no Recife Antigo uma Boêmia pelo mesmo preço. A turma gosta de explorar o cidadão bebum. Num canto o preço estava razoável e no outro um absurdo, mesmo assim, ambos atacavam friamente meu bolso.
Andei pelo quarteirão pensando em ir aos bares que costumo ir. Mas voltei, e decidi tomar uma cerveja no Ponto de Encontro. Voltando as mesmas barbas. Cheguei ao balcão e falei para o mestre que estava suando cada vez mais – uma cerveja, por favor! Ele respondeu – vá para uma mesa que você será atendido – o problema era mesa que não tinha. E depois percebi uma coisa. Só tinha um garçom que estava atendendo e colocando a mesa de quem chegasse, também só tinha uma pessoa recebendo a grana do povo que era o dono do bar, que também era o cozinheiro, eu acho.
Pedi uma mesa para o garçom que eu acho que não me ouviu. Então às 22h12 da noite se inicia uma batalha de resistência, saco e compreensão.
Primeira luta da noite: como conseguir uma mesa sem se irritar.
O camaradinha, atendia, passava troco, colocava mesa, despachava, ria, ouvia um monte de vozes, fazia tudo isso e ainda mais se você pedisse. E eu? Fazia cinco minutos da minha chegada e ainda nada. Encontrei um cara que sempre passa lá no trabalho, ele me ofereceu uma mesa, para sentar com ele. Mas percebi que ele tinha pegado outro copo e não era para mim, ele certamente esperava alguém. Então deixei seu convite de me sentar lá para outra ocasião. Além do mais. Um bom bêbado bebe só, e tem para si uma loucura demasiadamente solitária e para mim esta de bom tamanho. Aprendi essa com o velho Charles Bukowski.
O relógio batia em seis minutos de espera, um tatuado chega e imediatamente consegue uma mesa com cadeira e uma boa cerveja. Ele não precisou pedir nada. Ta aí, o bom de ser bem conhecido num bar. O serviço fica automaticamente. Oito minutos depois, finalmente consegui uma mesa, mas falta-me uma cadeira e a cerveja. Eu bobo aqui. Não suspeitava então se iniciou mais uma luta.
Segunda luta da noite: a cadeira para o jovem rebelde cansado.
A luta pela cadeira era o seguinte. Eu podia chegar lá e tirar uma cadeira do molho e me sentar, sendo que, o que me impedia? Era minha mochila. Se eu fosse tinha que deixar a mochila marcando a mesa, porém, poderia ter a sorte de algum esperto pegar minhas coisas e sair correndo. Aí, vocês que são um povo também esperto me falam – leva a mochila e pega uma cadeira – se eu saísse e deixasse a mesa sem nada para marcar minha presença quem visse ela ali dando sopa iria ocupá-la imediatamente e novamente eu ficaria sem mesa. Então esperei, e lá foram mais cinco minutos até conseguir uma cadeira. Total treze minutos de espera. A cerveja não demorou. Veio geladinha, perfeita, junto com um copo plástico, recomendo, beba só em copo de vidro só assim não estraga o sabor da cerveja. Tudo completo, só faltava uma garota que adore literatura e outras impressões artísticas.
Tudo bem tudo azul. Eu e minha cerveja e algumas notas tímidas sobre as primeiras impressões do bar e da região. Vi alguns conhecidos que se me vissem iriam fazer a festa e com certeza correria o risco de chegar muito alto tocando céus e nuvens. E isso eu acho ótimo.
Sendo que sou desses que quando está na rua prefere ficar sozinho tomando sua gelada, lendo um livro, rabiscando caderno, tendo momentos ótimos e bem profundos de introspecção.
Os conhecidos passavam como ventos me ignorando, levando embora sua rota cega. Depois de fartos goles a cerveja acaba, dou uma blitz nos meus bolsos e vi que tinha uma grana muito fraca mais para diversão. Mas uma coisa me encasquetava desde que cheguei aqui, pelo ambiente, acho que eles cobram o famoso 10% sabe o 10% que fode tudo? É fode tudo mesmo, por causa disso você arranja briga na hora do racha, encherga os pirangueiros e aproveitadores de plantão, não consegue calcular direito quanto gastou e por fim sente medo de não ter o suficiente. Essas coisas, além do mais. Há um trambique clássico nesses 10% do garçom, uma: o garçom nunca ganha os 10% trabalhei como garçom num restaurante e sei bem como é isso e outra uns aproveitam o déficit do brasileiro para enfia a faca na conta. Então fiz a tal pergunta – ô amigo, aqui cobra 10% então o que aconteceu meninos e meninas? Eles cobravam os 10% e perguntei quanto era minha conta e veja bem: uma cerveja é R$ 3,30 com os 10% ficou R$ 3,85 viu a o calibre da faca? Se eu pedisse outra ficaria assim de R$ 6,60 para R$ 7,85. É pra se lascar. Então prevendo a tempestade, paguei e segui para outro lugar.
Novamente me vi nas ruas do grande Recife vagas para meu pensamento e minha pequena revolta sobre desonestos 10% porque quem deve pagar o garçom é o patrão que ganha mais e não nós. Eu acho isso uma inocente exploração para o consumidor. Quem bebe todas e não se liga se arromba no final.
A noite já ia para as 23h30 quando entrei no bar do Timão onde evitei ir de primeira, tomei uma cerveja e um delicioso caldinho de feijão para dar uma sustentada no nego. E sabe quanto gastei? Menos que gastei lá no outro bar. O bar fechou como os olhos de uma criança que ver seu parque de diversões se apagando. Fui rezando para não ser assaltado, rezando mesmo, o pai nosso todinho. Peguei o ônibus e fui calado pra lá de Bagdá.