Micos

A crônica do colega Wilson Pereira, Pedra nos rins, me fez lembrar de dois causos semelhantes -- sobre como se deveria ficar de boca fechada numa festa pra não se pagar mico.

O Wilson se saiu muito bem da saia justa. Vai ver é porque ele não tem nenhum pendor pra ser drag queen ou escocês. Já eu, protagonista do primeiro causo, e a minha amiga, do segundo... deixa pra lá.

*

Primeiro causo

O almoço ia animado e concorrido. Todos os amigos do casal recém-casado estavam presentes, lotando o apErtamento, e conversavam animadamente sobre zil assuntos ao mesmo tempo, como de costume. Lá pelas tantas, chegaram umas cinco ou seis pessoas que me eram levemente familiares -- o que me levou a deduzir que seriam daqui da cidade, já que ninguém fez as devidas apresentações -- e que ficaram sentadinhas, todas juntas, num cantinho da sala, conversando baixinho.

Foi então que alguém fez a pergunta fatídica:

-- Vocês foram assistir ao Maria, Maria?

Sim, eu fui.

Na primeira temporada, quando o Grupo Corpo passou por aqui, em turnê nacional, fui lá conferir e me encantei com tudo! Coreografia -- sempre me impressionou a capacidade dos bailarinos de fazerem com toda leveza, suavidade e elegância, os esforços físicos mais alucinados, possíveis e impossíveis --, bem como figurino, cenário, iluminação e, claro, a impecável música do Milton Nascimento e performance dos artistas.

Depois disso, o Grupo apresentou mais alguns espetáculos -- todos maravilhosos -- e, em seguida, partiu pra turnê internacional e levou o Maria, Maria pro mundo todo ver e aplaudir. Sucesso absoluto!

Na volta, uns 3 a 5 anos depois da primeira temporada, resolveram refazer uma turnê nacional com este mesmo espetáculo e novamente passaram por Brasília.

Isso aconteceu justamente por ocasião do almoço lá no apErtamento do casal amigo. E a linguaruda aqui resolveu responder à pergunta feita:

-- Eu fui, mas não gostei desta vez... Na primeira temporada, eu achei maravilhoso, tão original e emocionante, tão forte e ao mesmo tempo suave, bonito, e eles dançavam com evidente prazer e volúpia... Mas desta vez eu achei que eles já estavam enjoados desse trabalho, depois de tantos anos apresentando o dito cujo pelo mundo afora. Achei que eles dançaram burocraticamente, sem tesão, como quem vai cumprir expediente só pra bater o ponto.

Nem bem acabei de dizer isso, uma colega ao meu lado enfiou com decisão seu indignado cotovelo nas minhas desprotegidas costelinhas e sussurrou no meu ouvido:

-- Você sabe quem são aquelas pessoas ali no cantinho, que chegaram ainda há pouco?

-- Sei não... quem são eles?

-- Bailarinos do Grupo Corpo.

Fecha o pano. Rápido!

*

Segundo causo.

Também um almoço, desta feita numa linda casa em Búzios.

Minha amiga B., que andava pela cidade a passeio, estava presente neste almoço, levada por um colega. Não conhecia nenhuma outra pessoa, mas, longamente treinada pela vida de filha de diplomata, ficava perfeitamente à vontade entre estranhos. No entanto, neste dia em particular, talvez acometida por uma TPM galopante, ela não se sentia nada diplomática e, pra piorar, estava um tanto entediada com a conversa fiada dos ilustres desconhecidos e com a música de fundo.

Lá pelas tantas, alguém falou:

-- Vou botar um disco da N.C.. Alguma objeção?

-- Sim. -- disse a minha amiga, um tanto ácida -- Eu faço objeção. Não suporto essa cantora! A voz dela e o jeito de cantar são intragáveis! -- arrematou dando uma profunda tragada no cigarro.

O colega dela, que estava ao lado, então, perguntou bem baixinho:

-- Você sabe de quem é esta casa onde nós estamos?

-- Sei, de uma amiga sua.

-- Na verdade, esta casa é da mãe da minha amiga... E a mãe dela é a N.C..

Fecha esse pano logo, antes que alguém pague outro mico horrendo desses!