Estrangeiro

Se vou, é porque quero, se voltar, é por sentir medo. Mas nunca há volta.

Na bagagem, só levo aquilo de que não posso me desfazer. Na volta, sempre trago um peso a mais. Mas no caminho, me esforço pra ir aos poucos abandonando aquilo que vinha trazendo comigo, coisas que já não mais me são tão úteis, que posso ir perdendo pela estrada, com certa dificuldade, porém sem arrependimentos, pensando que talvez possa fazer um outro alguém tropeçar, e tomar aquele estorvo pra si, dando-lhe alguma utilidade novamente, e pensando também, que ao abandonar aquele fragmento, deixo livre espaço para absorver novidades, para que possa delas usufruir muito bem, para quem sabe um dia, abandonar novamente à beira da estrada.

Minha jornada é assim, toda feita de efemeridades, valiosas, porém pouquíssimo sólidas, que se dissipam facilmente com os ventos dos lugares por onde passo, assim como as pegadas, que após um pequeno espaço de tempo, somem sem deixar vestígios no chão.

As paradas são várias, curtas, e necessárias, para construir, ou esbarrar em histórias, contos, verdades, sonhos, que rapidamente coloco debaixo do braço enquanto me apronto pra seguir viagem. Também vou escolhendo cenas, sorrisos, olhares, sabores, aromas, coisas miúdas que posso ir enfiando nos bolsos, deixando bem guardadas dentro de mim. Apenas o que posso carregar sem esforço com as duas mãos, que precisam estar sempre livres para tocar e conhecer todas as miudezas possíveis desse mundo.

Mudam as estações e sempre chega a hora de partir, carregando um pouco comigo, deixando sempre algo de mim, mas estando sempre completo. Talvez deixando saudades, quem sabe sentindo saudades, espalhando por diversas partes finíssimos fios que me prendem ao ontem, fios que vou levando enroscados nas pernas, que à medida que tomo distância, vão se esticando, esticando, esticando, até que em certo ponto já não se possa mais ver aonde é que se ligam, quando perde-se de vista o ínicio daquele frágil emaranhado de memórias, quando assim, sem qualquer alarde, se rompem, naturalmente, sem puxões. Há certos fios que prefiro cortar, mas esses nem é preciso mencionar, os que tem certo valor, são aqueles que preferi deixar lá ao longe, amarrando uma pequena esperança de retorno, num laço de alegrias, que de qualquer forma, se desfaz.

Chutando pedrinhas e recordações, sempre em busca do próximo porto, sem roteiros, sem definições, sem guias, sem amarras, sem destino, cedendo aos impulsos dos pés, e da sorte.

Só o viajante conhece a emoção de abrir os olhos pra mirar o incerto amanhã, e sentir na face a brisa fresca de sua liberdade.

L
Enviado por L em 24/08/2009
Reeditado em 24/08/2009
Código do texto: T1770881
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