UMA MENINA PERDIDA






Quando desisti da clínica em psicologia, direcionei a carreira para outra área. Começava minha ligação com a palavra, trabalhando em uma revista. No início, assinava uma coluna de humor e depois, fui chamada para a redação. Uma das minhas funções era "revisar" o texto alheio.


Neste período, aprendi mais sobre a vaidade e o ego do que na faculdade de psicologia. E passei a exercitar o respeito incondicional ao trabalho de alguém, ao entender que a palavra significa valor e sentido.


A vida é feita de reviravoltas, como a palavra, uma caixa de surpresas. Estabelecida em São Paulo, numa obra do destino e coração, mudei, por dois anos, para outra cidade. Deixei para trás trabalho, família e amigos. De um dia para outro, minha vida parecia suspensa. Tudo para dar lugar a outra página. Uma nova história. Nada do que sonhei aconteceu. Projetos e planos descontruídos dia após dia.


Não sei explicar a sensação de vazio que passa a ocupar o juízo. Ao invés de refletir o caminho e as escolhas, permiti que coisas e pessoas tomassem conta do espaço das minhas decisões. Paguei o preço. E a responsabilidade é apenas minha.


Neste caos, nascia uma escritora. Na ausência de controle da vida descobri que algo fazia sentido em meio a tantos desmoronamentos.


E escrever salvou minha sanidade. Preservou minha existência.


Por isso, tenho tanto respeito e amor à palavra. Seja em meu texto ou de qualquer outro escritor.


A palavra me acolheu em momentos da mais pura solidão. Quando tudo ficou escuro e os rostos familiares não estavam ao redor, escrevia. Em meio à luminosidade de uma cidade belíssima, ao sentir a dor do isolamento dilacerar meus sonhos, escrevia ainda mais!


Corri para a palavra como uma menina perdida na praia que enfim, reencontra a mãe.


E em seu colo me aninho, enquanto uma lágrima impertinente teima em escorrer sobre o ponto final.





(*) Imagem:
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Dolce Vita
Enviado por Dolce Vita em 23/08/2009
Reeditado em 23/08/2009
Código do texto: T1770082
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