ÊTA, VIDA BESTA!

Há dias em que acordamos e saímos da cama como um Curupira; com os pés virados ao contrário e uma vontade danada de dar bordoadas nos infratores da nossa floresta.

E saímos assim, cambaleando em busca de um café preto e fumegante. Giletes velhas e sem fio rompem-nos a velha cara de pau matinal e deixam um trocinho de esparadrapo no queixo choroso. A resistência do chuveiro não oferece nenhuma resistência aos pingos gelados d água que nos fustigam os neurônios teimosos em não se abrir para o dia. O maço de cigarros cospe apenas um vento vazio de intenções. Na passagem pela portaria, o Zé nos entrega um envelope do SPC com carimbinho: Urgente - cobrança de cagadas passadas. Na garagem o motor de partida do velho Gol não parte para lugar nenhum, somente resmunga um nhem-nhem-nhem tradicional e depois se cala para todo o sempre. Pilares estreitos e uma moto na frente impedem a tentativa de dar um tranco no bicho preguiçoso. O jeito é correr para o ponto do busão. Compromisso na primeira hora da manhã é foda e não perdoa.

No coletivo coletamos todas as sensações possíveis: mulher tossindo gotículas de Gripe Suina, malandro querendo correr os dedos na bolsa da loura, jovem gordo imprensado no banco lateral, cobrador cobrando respeito e um passinho á frente. Para ajudar, o coletivo tem sua correia dentada repentinamente desdentada e, á pé, partimos todos nós passageiros de uma nau perdida, em meio à avenida de trânsito caótico.

O elevador da empresa resolve fazer greve no quarto andar e, com mais seis pessoas em pânico, quinze minutos parecem uma eternidade.

Uma hora de atraso, chefe com cara de bosta, cliente “ fumando numa quenga” e o Curupira aqui, todo troncho sem conseguir abrir o note-book com o projeto da campanha.

A gota d água foi a espinha de bacalhau do bandejão do meio-dia. O grito foi ouvido em todos os corredores da praça de alimentação:

_ Puta que o pariiiu!!!!

Como não há mal que sempre dure, a noitinha nos encontra no quarto do hospital, em meio a amigos e parentes solícitos e cordiais demonstrando o carinho imprescindível; até o chefe com uma revista Playboy com capa de uma BBB qualquer para nos entreter.

Foi uma crise de stress, falou o médico residente plantonista, só isso.

Dia seguinte, começa tudo outra vez. Êta, vida besta!