O sofrimento de um batedor de carteira
Domingo, dia de jogo em Recife, ônibus lotado. Uma bolsa de mulher dando sopa ante os olhos de um batedor de carteira, que por infeliz sorte a batida se deu em frente à delegacia, da minha janela que ficava de frente para a rua, pude assistir a tudo, a gritaria dos passageiros revoltados com o roubo pedindo para o motorista parar o ônibus e prender o cara... e ele... o cara, devolvendo a carteira da moça, intacta, pedia para ser liberado, pois a sua filhinha de dois anos estava em casa sem alimento, nenhum apelo foi atendido, acabou preso.
Do meu AP, dava para ver e ouvir tudo que ali acontecia, pois o muro era baixo, e o meu AP era mais alto... nessa noite pude presenciar os maus tratos aplicados àquela infeliz criatura. Tiraram-lhe as vestes deixando-o apenas de cueca, quatro policiais... cada um tinha em suas mãos uma grossa tira de borracha de pneu, e começaram a bater no preso, o ritual era repetido por cada um, quatro lapadas seguras, que chegava a doer no ouvido, no final o coitado nem conseguia gritar apenas gemia, como se não bastasse ao perceber que estava quase desfalecido, jogaram-lhe um balde de água fria obrigando-o a levantar-se, mal ele conseguir ficar acocorado, jogaram-lhe outro, e assim foram quatro até ele recobrar os sentidos, da janelinha do meu banheiro vi nitidamente como aquela criatura estava retalhada e sangrava muito, como não conseguiu ficar de pé, pois já estava quase entrando em choque, ali mesmo no chão de terra o deixaram...
Mesmo sabendo que ali se encontrava um elemento nocivo à sociedade, aquela cena cortava o coração.
Foi quando apareceu a mãe do coitado com um advogado, desses de porta de cadeia bem salafrário que já foi se enturmando com os agentes que o levaram até o quintal, e ao perceber o estado da criatura ali desfalecida, dirige-se à mãe dele para dar-lhe a noticia de que, seu filho havia se envolvido em briga de rua, estava muito machucado e teria que ser removido para o hospital, dispensou a coitada que inocentemente foi embora achando que o filho realmente iria ser socorrido, a conivência mais uma vez ali imperava... (advogado x policial). Qual não foi a surpresa, em pouco tempo o camburão do IML encosta para remover o corpo!
Conclusão: A pobre mãe sai daquele recinto, inocente, confiando nos homens da suposta Lei... da morte? nem de longe imaginou que seu filho havia sido brutalmente torturado, chegando a falecer. É lamentável que um advogado, conhecedor dos direitos, provavelmente pai, permita-se a tal conivência. E nisso vai-se uma vida, que não deve ter sido nem a primeira nem a última em tais circunstâncias.
Diná Fernandes