Um presente muito especial
No dia do meu aniversário ganhei alguns presentes muito bacanas, que me tocaram de um modo todo especial.
Logo pela manhã, mal havia acordado, bateram à porta e, quando atendi, tive a bela surpresa de ver um motoboy me ofertando um lindo presente, com um cartão muito carinhoso e deliciosamente redigido e assinado por uma nova grande amiga e eventual parceira de trabalho, que mora no Rio.
Mais tarde vieram os abraços e carinhos dos parentes, aderentes e amigos, o que pra mim já seria presente mais do que gratificante e suficiente. Sem contar os telefonemas e e-mails dos que moram longe, bendita tecnologia que possibilita essas modernidades até no campo da afetividade nos relacionamentos humanos, zerando as distâncias e trazendo um pouco do calor amigo embutido nas palavras ditas com mel e velinhas coloridas alegremente acesas pontuando tudo...
Mas o melhor de todos os presentes foi também o mais inusitado e inesperado, até porque foi perfeitamente incidental e circunstancial -- mas nem por isso menos presente.
Alguns diriam que foi enviado por Deus, outros, pelo Destino, outros ainda diriam que nem mesmo foi enviado por fosse lá quem fosse, que foi apenas uma feliz coincidência. Mas eu tenho certeza -- e tive mesmo no momento em que ele chegou -- que se trata sim de um lindo e precioso presente... e não me importa quem ou o que me enviou.
Explico. Ao caminhar pela calçada, ouvi atrás de mim o som de um blues maravilhosamente executado numa gaita de boca.
Meu ouvido roqueiro e bluseiro imediatamente ficou em pé e atento -- não era pouca porcaria, não... era blues da melhor qualidade e cheio de estilo e swing! E pela nitidez do som, percebi que se tratava de execução ao vivo. Então me virei pra olhar de onde vinha... e vi, a uns cinquenta metros de distância, um rapazinho com toda pinta de gente simples e humilde, que vinha tocando divinamente à medida que caminhava.
Parei pra olhar e ouvir melhor. E o garoto, percebendo que tinha agora uma platéia atenta e receptiva, ainda que de uma pessoa só, caprichou ainda mais nos floreios e sincopadas... e colocou um pouco mais de lentidão e ginga no caminhar.
Quando ele chegou pertinho, ao mesmo tempo em que dava o floreio final, cheio de bossa, abri um sorriso maior que a cara e aplaudi lenta e calorosamente... Ele sorriu contente, fez uma leve e elegante inclinação com o corpo, e recebeu agradecido e orgulhoso meus elogios enfáticos e sinceros -- tanto mais enfáticos e sinceros, quando soube que ele toca há apenas um ano e que sua gaitinha é daquelas mais simplesinhas, sem nenhum recurso extraordinário... O som fantástico que ele faz é mérito único e exclusivo do talento que ele tem...
Agradeci ao rapazinho e fui-me embora com uma sensação de felicidade e satisfação deliciosamente raras.
Eu poderia elaborar aqui uma longa tese sociológica, psicológica e até mesmo astrológica pra explicar o porquê... mas sou preguiçosa e incompetente demais pra fazer isso e, além do mais, prezo vossa paciência, queridos leitores que têm mais o que fazer...
Mas posso dizer que, em primeiro lugar, música assim tão boa e ao vivo sempre me encharca de satisfação e felicidade. E em segundo lugar, mas não menos importante, testemunhar talento, gosto refinado e perseverança num garoto que, pela evidente origem, tinha tudo pra ter trilhado o caminho "fácil" da malandragem e do parasitismo, senão coisa pior, me devolve um pouco da fé na humanidade, que ando perdendo aos bocadinhos e bocadões por aí.
Posso afirmar que há muito, muito tempo não ganhava um presente tão bonito e significativo e precioso como esse...
E fiz o resto do meu caminho andando no ritmo swingado desse presente tão lindo, que levei ressoando claro e nítido nos ouvidos agradecidos da minha alma aniversariante e contente.