EITA GRIPE DANADA!

Olha, vou lhes contar uma coisa: o ser humano é esquisito, engraçado e, em muitos casos, parece desprovido da tal da massa encefálica, a dita cinzenta. Ou seja, em muitos casos, raciocinar é um verdadeiro sacrifício. Nem mesmo Tico (o maquinador lógico) e Teco (o personagem tolo) ajudam na racionalização.

Sábado passado, depois que participei do programa Pedagogia da Gestão, com os amigos João Maria e Mário Gérson, voltei febril para a minha residência. O restante da noite foi de uma alternância entre o cochilo gostoso e o acordar, em sobressaltos, devido à temperatura alta.

No domingo, prevenido que sou, busquei orientação médica, sendo informado que era, de fato, uma gripe muito forte ocasionada, principalmente, pela falta de uma alimentação adequada e dentro dos horários regulares, acelerada, talvez, pela falta dos suplementos, ou seja, as vitaminas e também, com toda certeza, pela ansiedade e tensão dos últimos dias - estes que antecederam o lançamento do meu livro. A correria, o entra-e-sai do carro, na maioria das vezes, quente; salas com ar-refrigerado nos locais onde fui dar entrevistas: jornais, rádios e TV; o próprio local do lançamento, na Biblioteca Pública, tudo isso contribuiu para eu ficar de molho, em repouso absoluto, conforme prescrição médica.

Porém, como os meus afazeres, na maioria das vezes, não podem ser adiados, tive que sair da minha clausura e encará-los de frente.

Primeiro, uma ligação do meu orientador, chamando-me, urgente, para refazer boa parte da minha monografia do curso de Comunicação Social. Expliquei-lhe sobre a minha saúde. A resposta veio assim:

- Passe na farmácia, compre duas máscaras cirúrgicas e venha! – disse o distinto professor.

Fiz suas vontades. Munido da máscara cirúrgica, enfrentei quase três horas de conversa monográfica.

Com ele, tudo bem. Entretanto, assim que pus a máscara, passei a perceber que havia certo preconceito contra o meu visual. Não liguei. No entanto, aos conhecidos, eu sempre dava uma satisfação:

- Pessoal, é uma questão de higiene e prevenção. Com isso, evito contaminar o ambiente em que me encontro e, em contrapartida, também não adquiro agentes infecciosos de pessoas que estão, também, contaminadas por outras viroses, e contribuo, com isso, para a defesa do meu organismo.

De volta da Universidade – ainda de máscara (foi incômodo no início, mas, depois que eu me acostumei, não quis mais tirá-la: é muito higiênica e essencial), quando estacionei em frente a minha casa, os vizinhos – que estavam nas calçadas – olharam-me como se eu fosse um ET. De dentro do carro eu observava os cochichos. Um garotinho, que sempre vem ao meu encontro, toda vez que chego em casa, desta vez, foi impedido pela mãe, que o pegou nos braços, segurou-o com força – embora ele chorasse e se debatesse querendo descer –, até levá-lo para dentro de sua residência.

Mais tarde, minha digníssima me disse que a conversa entre elas era a tentativa de adivinhar o porquê de eu estar de máscara.

- “Cumadi”, acho que ele está com algum problema nos “denti”, disse uma.

- Pode ser, disse a outra. Uma vez o dentista deixou um buraco aberto no meu “denti” e foi preciso eu ficar de boca fechada usando um “tampão”.

- Sei não, disse a mais sabichona da turma. Acho que isso tem a ver com essa tal de gripe “do frango” que a televisão fala. Vai que ele “pegou” a danada e está querendo se prevenir de todo mundo?

Quando a minha esposa me contou, nós rimos muito. Primeiro, a desinformação é geral, pois confundem a gripe aviária com a gripe suína (H1N1); segundo, se eu tivesse contraído a tal gripe “do frango” não tinha mais porquê me prevenir: era fato consumado. Contudo, era um dever meu evitar a propagação da doença entre os meus e a comunidade onde moro.

Por fim, hoje, uma quinta-feira, eu tive que sair novamente. Duas lojas de crediários pela frente. Na primeira loja, assim que entrei, todos que estavam na fila, a minha frente, fizeram questão de me deixar passar. O interessante é que, enquanto eu estava na fila ou sendo atendido, ouvi inúmeros espirros, dezenas de tosses e tantos outros assoares, mas ninguém se incomodou ou, discretamente, pôs a mão sobre o nariz ou a boca. Inclusive, a caixa que me atendeu, olhando-me com cara de incrédula, me disse o seguinte:

- Já faz um mês que estou com uma gripe danada e não fico boa de jeito nenhum!

Na saída, passando por duas senhoras, uma delas me olhou e me fez a seguinte pergunta:

- Esta máscara é para fazer charme, igual a Michael Jackson, ou é porque o senhor não quer se misturar com a gente?

Eu sei o que os leitores estão pensando. Não, não mandei, nem tampouco parei para explicar. Preferi apenas dar um sorriso. Infelizmente elas não perceberam. Eu estava de máscara.

Na segunda loja, quando chegou a minha vez, duas caixas, que ficaram livres, hesitaram em apertar suas campainhas. A que me chamou, fez questão de demonstrar seu incômodo distanciando a sua cadeira de perto da caixa autenticadora. Não me incomodei. Agora, duro foi ver, na saída, ela espirrando na direção de sua colega, ao lado, sem a menor preocupação em evitar a disseminação, pelo ambiente, das gotículas, talvez, carregadas do vírus da gripe. Depois destas, o melhor é evitar tirar a máscara de Michael Jackson (que Deus o tenha muitos anos sem nós!).




Obs. Imagem da internet
Raimundo Antonio de Souza Lopes
Enviado por Raimundo Antonio de Souza Lopes em 16/08/2009
Reeditado em 06/12/2011
Código do texto: T1756829
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