Fraldas e Bengalas
 
          Foi assim que Sérgio Wagner apresentou o grupo musical de que faz parte, o Black Dogs. E o espetáculo que mostraram ao publico esta noite foi surpreendente. Jazz. Entendo eu de jazz? Não. Mas entendo de transcendência, o que dá no mesmo. O que é jazz, perguntou ele a platéia e sem esperar respostas, respondeu. Primeiro, tecnicamente. Depois, na língua que eu entendo. Jazz é quando a alma toca. Não é o músico que toca, disse ele: é a sua alma. E se é a alma que toca só pode ser ouvida por outras almas. Uma simples questão de transcendência.
O grupo é do Zé Hugo, irmão caçula do Sérgio.  É bastante eclético, em relação à faixa etária – tem desde bengalas como é o caso do Sérgio e do Dílson, a garotos que ainda não tiraram as fraldas. Quando eles começaram a tocar eu compreendi perfeitamente porque o jazz é uma música divina. Havia uma única estrela brilhando no céu que eu via – e eu fui para lá enquanto a música fluía e se espalhava para muito além de qualquer espaço.
 
Dedicaram à noite a Les Paul, o guitarrista americano que morreu hoje, aos 94 anos. E abriram o seu show com Chick Corea – depois disso não posso fornecer mais nenhuma informação: eu estava em estado de graça e se passasse uma ventania por ali eu nem notaria.  Mas a ventania não passou, pois o espírito do vento se recolheu para gozar a sublimidade daquele momento.
 
Não vi a noite passar. E ainda agora, enquanto escrevo, ela não passou. Vai perdurar por um bom tempo, enquanto o cotidiano não desfizer o encantamento. E é desta matéria que é feita a Vida. São momentos assim em que se pode dizer tranquilamente – Deus existe. Os anjos existem. E a música é a língua que usam para se comunicar.