VÉSPERA DE JOGO
Driblo um, driblo dois, três, tento esticar o passo... Quase na grande área, sou rendida pela arbitragem. Sinal vermelho. Aguardo o desfile do trafego intenso com movimentos ansiosos. O corpo continua aquecido.
Tento manter o moral, não perder a esportiva... Véspera de jogo é assim, todo mundo corre para chegar mais cedo, organizar os preparativos, tirar do armário a camisa da sorte, fazer todas as mandingas do tetra e do pentacampeonato, e encher a geladeira com cervejas para o grupo de calorosos torcedores.
Perto do estacionamento, uma falta me lança ao chão. Um senhor bêbado, sentado no meio-fio, desabafa o seu abandono: “Estamos em guerra”. Fora de sintonia. Penso em voltar e avisá-lo sobre a copa, a iminência do jogo de estréia do Brasil, a festa verde-amarela, o hexacampeonato, mas desisto... Sinto cambalear com a quase contusão na alma. Até das alegrias do futebol, aquele pobre homem foi privado.
Mesmo com o time fortalecido pelo carro, o trajeto até o gol está embolado, alguns congestionamentos e muitos sinais vermelhos. Numa das inúmeras paradas, um carro-forte passa disparado amassando a lateral direita do meu carro. Refeita do susto, estaciono na próxima esquina e aguardo o motorista que vem ao meu encontro. Olho a lataria rasgada da porta traseira com as pontas para fora.
O homem se aproxima truculento. Acusa-me de ter batido nele. Como? Eu estava parada! O homem continua falando grosso: “Eu estava na faixa. Você virou para entrar na rua e atingiu o meu carro.” Tento manter a calma e mostrar que se fosse assim minha lataria estaria para dentro e não rasgada com as pontas para fora, além de ter toda a lateral arranhada e o espelho retrovisor quebrado.
“Vai encrencar, dona? Já saímos do local... Vai continuar insistindo?”
Desisto do diálogo e me aproximo do carro-forte para pegar a placa. Para minha surpresa, de lá sai um homem armado, supostamente segurança, que fica me encarando. Nenhuma testemunha se apresenta. Na rua, só vejo os dois homens e uma infinidade de carros apressados. Rendo-me à lei do mais forte. Intimidada, entro no meu carro com o enorme sentimento de impotência e contabilizo o prejuízo.
Penalidade máxima e não havia arbitragem imparcial para me dar a oportunidade de reverter o jogo.