O RELÓGIO CUCO

O RELÓGIO CUCO

Ainda com poucos dias de vida, no seu carrinho de bebé postado pela mãe defronte a uma pequena caixa em formato de casinha, da qual pendiam dois pequenos pesos de bronze, dos quais aquela engenhoca dependia para a função a que se destinava. O pequeno recém-chegado ao mundo dos homens, parecia fascinado com o vaivém de algo que se movia ininterruptamente para a direita, para a esquerda, para a direita ... o pêndulo, o marcador do tempo e, de tempos a tempos um pequeno vulto que irrompia magicamente de dentro, e soltava sons ainda não conhecidos, pois eram sons diferentes da voz da mamãe ou do papai, ou dos sons outros que vinham da rua.

-Ainda haveria um dia em que descobriria os mistérios que se escondiam dentro daquela enigmática caixa. Que passarinho era aquele que aparecia, emitia o seu cu-cu, e logo desaparecia e, se fechava por detrás daquela janelinha, como se receasse a presença e intimidade dos humanos!... Os dias iam passando com lentidão de eternidade, e dentro da cabecinha daquele pequeno ser as coisas iam tomando forma ainda que, lentamente, pois no começo da vida as coisas assim são, sem pressa, e, porque a pressa é inimiga da perfeição.

Nosso amiguinho, entretanto, crescia, física e intelectualmente, e como todo o ser inteligente, sua curiosidade mais se apurava e já se lhe desenhava como traço marcante de sua personalidade, a dita curiosidade.

Certo dia com a idade que se pode contar nos dedos de uma mão, e longe do ambiente das primeiras impressões, improvisa um poleiro de duas ou três cadeiras e, caça o indefeso cuco. Arranca-lhe as asitas, estropia-lhe o bico e, só não o depena porque penas não cobriam seu impúbere corpito.

Estava desfeito o mistério da “caixa de pandora”, ou não!?

Hoje, aquele ‘cuquinho’, testemunha dos melhores momentos de duas vidas, de muitas vidas, teimosamente, continua a marcar os minutos, as horas, o tempo. Desafina-damente, é verdade, mas afinal quem há que não desafine com o tempo, até os sinos feitos de bronze ao passar dos anos também perdem seu timbre original.

Aquele cuco, ou este relógio cuco foi presente de casamento, para mim e esposa de valor inestimável, e porque os sons do canto dessa ave fazem parte dos sons que me rodeavam no habitat de meus verdes anos, traze para dentro de mim cada vez que ouço o seu canto, ainda que, desafinado, todo um mundo cheio de encantamento, semelhante talvez ao que meu pequeno filho devia sentir a cada aparição do misterioso passarito, lá na sala de jantar. Fiquei muito magoado com a quase destruição do pequenino cuco. Mas passados já lá vão uns maduros anos, não posso deixar de sentir saudades daquele dia, e, lá no fundo, bem que gostaria, ai como gostaria, que tudo se repetisse de novo.

8.8.2009

Eduardo de Almeida Farias
Enviado por Eduardo de Almeida Farias em 08/08/2009
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