53 - COISAS... DA MENTE.

Déjà Vu

Em forma e gênero de tudo ele criava era um artista, de peças e palavras. Tinha um espírito inventivo para palavras desconhecidas às vezes desconexas, citadas para outros sem sentido, para ele, era forma bem entendida, no latim e matemática, forma milimétrica de se expressar. Dizem que ficou assim meio abilolado de tanto estudar.

Vivia fazendo então pequeno artesanato, correntes, figas de madeira ou de massa, moldadas com muito carinho, oratórios e bichinhos de enfeitar e para meninos brincar. A mesma satisfação que ele tinha para fazer, se não vendesse dava tudo para os outros vizinhos e até estranhos. Coleção de bichinhos, aves e pombas, cobras, cabritos. Fazia como o São Francisco e assim também se vestia.

No inicio de sua carreira seria médico veterinário ou pediatra especialista em desvios mentais. Nem uma coisa nem outra na vida se tornou. Assim meio lezo das ideias a família mandou buscá-lo quando lá da escola receberam notícias que o menino estava doente. Enquanto estudante, rotina dura se lhes impunha estudar até altas horas levantar bem cedo escuro ainda para caminhar e estudar as mais diversas matérias. Era chamado CDF na escola e na vida (hoje, seria nerd).

Sempre foi assim muito responsável além da conta diziam seus amigos, os poucos que tinha. Eram somente aqueles que os mesmos interesses tinham estudar, estudar, estudar, melhor forma ele entendia de a vida transformar.

Sua primeira vocação era por causa dos animais que tinham em casa, verdadeiro zoo-mirim... pacas, tatu, cotia, coelhos nos diversos viveiros eram criados, codornas, papagaio e periquito, até jacu havia. Dois cachorros perdigueiros com fama de serem bons de caça, um cão pequenez que só queria saber de colo e três gatos e dois canários em estranha convivência. Aves exóticas também.

De todas as suas prendas, tudo queria saber, o que comiam, como se desenvolviam e se reproduziriam em cativeiro, vibrou quando seu pai um dia lhe trouxe um porco do mato que apanhara na estrada da seis por cento. Na subida para a mina do Cauê, não é que o “bixim” deu bobeira e não fugiu com manada que comia a rocinha de tal de Zeca da Égua, plantada com autorização da chefia da Vale?! Do caminhão ele escapou do jeep teve jeito não. Ficou assim como no ditado, perna quebrada, o cateto, se não fosse trazido para a vila, virava papa-de-onça, que existiam na mata de São José, daqui bem de longe observadas no potente binóculo do José Benedito. Colocou tala, faixa de gaze, comprada lá na Farmácia do Sindicato, curou a pata do bicho que em forma de agradecimento por toda parte no quintal até dentro de casa queria seguir o seu médico protetor.

Mal sabia o rapaz que outras pessoas no bairro olhavam comprido vendo o Chiquinho, ainda que mancando e andando assim meio de lado, bem gordinho estava. Viam com outros olhos o bicho! Espetado e morto num churrasco bem preparado. Nem pensar!

Em véspera de natal o cateto sumiu, dentro de casa alvoroço. Imaginem! Família grande, uns a favor outros contra a presença do bicho, ainda mais com tanta mordomia. Procura daqui e dali não houve jeito: a raridade sumira.

Acho eu que a turma do rouba-cabrito fizera uma visita em surdina. Bem mais tarde meses depois cabeça do bicho foi vista rolada encosta baixo bem do alto do Pico do Amor, dentes arreganhados,... da onça escapou, mas foi pro bucho, regado com vinho tinto bem gelado de marca “Urussanga” no palhaço de cinco litros e farofa de azeitonas verdes e pretas, preparadas lá no Bar Restaurante do Mundico.

Enquanto isto o rapaz mergulhara em profunda agonia e desespero, daí para depressão nada demorou, trancou-se no seu quarto não saia para nada, para ninguém estava nem queria saber.

Assim, ficou meses, mais de ano, nem barba fazia mais. Remédio não tomava. Um dia destes, mês de dezembro, sol bem quente, dia claro, já fazendo mais de ano que o bicho sumira tendo ele mergulhado naquela tristeza danada, assim sem mais nem menos abriu a janela, arrumou o quarto, a cama, tomou banho, fez a barba e saiu assobiando como se nada tivesse acontecido por todo aquele tempo. Coisas da cabeça ou das promessas da mãe que já estava com calo nos joelhos e dedos das mãos de tanto desfiar contas do terço. Retomou gosto pelos estudos, pegou livros retirados dos caixotes de dinamite gravados a ferro quente com a marca Rupturita, trazidos lá do Cauê e como a "Caixa de Pandora" retirou de lá seu bem e seu mau.

Combinação perigosa, livros e todo este afã de recuperar o tempo perdido, foi mais ou menos por isto que quase ficou lelé. Os pais novamente aflitos, tratavam de arranjar coisas para ele fazer. Mas, qual que nada livro em cima de livro de volta, noite e dia!

Na oficina do pai passava horas a fio, o pai todo satisfeito, afinal o rapaz era muito bom em tudo que fazia. Mas o que ele queria mesmo é ter um lugar para, bem tranqüilo, estudar.

Tempo passando ele descobrira nova vocação, queria estudar para padre, afinal tudo que ele queria era cuidar de animais, no passado. Desta vocação agora descrente, quem sabe assim como padre poderia cuidar de gente, se não sofrida no corpo quem sabe na alma. Os pais, apesar de católicos, viam com apreensão. Logo percebiam que seu filho, com mania de perfeccionista, não iria se conformar se a padre chegasse um dia. Ainda que demorasse anos se agarraria aos livros, tal como sua mãe, na sua tortura diária como a mulher criada por Zeus, e nas preocupações do dia a dia. Ele corria o risco de ficar fraco da mente outra vez. NÃO DEU OUTRA.

http://www.recantodasletras.com.br/autores/Claudionor

Couto Pinheiro

CLAUDIONOR PINHEIRO
Enviado por CLAUDIONOR PINHEIRO em 08/08/2009
Reeditado em 06/10/2009
Código do texto: T1743460