FÉRIAS COMPULSÓRIAS

Lembro de invernos tão frios quanto este há mais de trinta anos. Naquela época morávamos na roça, distante da cidade uns 60 km. Havia certo ritual, uma preparação para enfrentar os dias frios. Estocava-se pasto seco para os animais e muita lenha nos celeiros. Os varais com muita espiga de pipoca pendurada. Queijo, vinho, lingüiça, farinha e melado, nos vasilhames do porão. No mês de julho inteiro eram férias no colégio. As tardes preenchidas com muita pipoca e melado, rapadura, chimarrão e café quente em torno do fogão a lenha. Jogávamos loto, trilha e baralho. Quando a neve começava cair, eu colava meu nariz na vidraça da janela da cozinha, apreciando com intensa admiração os minutos mágicos que a natureza proporcionava. Se a filharada se desentendia, meus pais tocavam todos para brincar no paiol. Era uma gritaria só. Á noite, meus pais dormiam cedo. Eu ficava com minha irmã, sobre o colchão de palha, sob o cobertor de lã de ovelha, lendo revistas de fotonovela à luz do lampião de querosene. O calor especial daqueles invernos, nunca mais senti.

Muitos invernos passados que eu já nem lembro e neste ano ele me aparece trazendo um frio de arder os ossos. De lambuja uma peste anunciada. Certamente, gripes e outras doenças de antigamente eram tão ou mais perigosas que esta Influenza. A diferença é que a gente nem ficava sabendo. Com a escassez de informações e pouca comunicação, as pestes ficavam distantes. Além do frio intenso, este inverno está branqueando muitos cabelos, não de neve, nem de geada, mas de preocupação. Com as férias compulsórias, nossos filhos estão em casa desocupados. A rotina das crianças é: computador-comer-dormir. Neste tríduo revezado eles ‘curtem’ as férias prolongadas. Nenhuma proposta de passeio é acolhida. Nos parques é frio e ‘não tem nada pra fazer’. Os shoppings, cinemas, restaurantes é preciso evitar por causa da peste propagada, o que não é do todo ruim, porque a gente coloca o pé nestes lugares e o dinheiro vai-se diluindo bolso afora. Bom seria poder viajar para o nordeste dos pais ou exterior. Mas se corre o risco de voltar pesteado ou até morto.

Em meio às férias compulsórias e neste engessamento epidêmico, driblamos os dias, praticando a paciência, tolerância, sabedoria; adequando-nos às novas situações. Afinal, só os adaptáveis sobrevivem, já anunciava Charles Darwin.