Noite Escura, Sintonia Clara
Quando a noite escura caiu e a tristeza chegou, derrubando portas e janelas, revestindo a minha casa com camadas de auto-piedade, tentei lembrar de Deus, ou algum mestre, qualquer ser celestial que alavancasse a minha vibração, que projetasse o mal estar para longe de mim, mas não consegui atingir tão sútil sintonia. Tentei canalizar a alegria, mas como eu estava dentro de um poço de melancolia; só consegui chorar a injustiça do mundo, pois o meu coração nublado e meu corpo impuro, tornava a minha consciência densa, pesada demais para pisar em terreno sagrado. Então, com toda a força que restava, e era pouca, puxei da memória, algum gesto, qualquer ajuda que recebi na vida, que fosse por certo, uma corda de esperança e lembrei de você.
Você que cruzou o meu caminho calçado de anonimato;
Cujo rosto não lembro, pois entrou mudo e saiu calado,
Mas que deixou no meu peito, sem esperar troco ou volta,
Um gesto de carinho, uma ajuda à toa,
Você valeu-me o dia.
Você que me emprestou a sua camisa quando a minha estava suja;
Que me deu uma caneta quando eu querendo escrever, fiquei sem tinta;
Que me cedeu o lugar na fila quando eu tinha pressa;
Você valeu-me o dia.
Você que me presenteou com uma palavra que foi rima quando eu estive surdo de poesia;
Que a gente nem se lembra, mas que quando recorda,
Uma lembrança puxa outra lembrança
E o esquecimento de você vira música,
Você valeu-me o dia.
Você anjo calado, que aparece na vida de todos nós,
Vestido de homem ou mulher, de velho ou de criança,
E que às vezes é um, às vezes é muitos;
Que é anjo do dia-a-dia, ser divino da Terra,
Que guarda sem cobrar pedágio,
Que cuida sem intenção segunda, sem exigir moeda,
Você valeu-me o dia
E
Também valeu-me a noite.
A noite,
Essa noite em que a lembrança do seu gesto altruísta, resgata a minha alma da morada das sombras e eleva meus pensamentos da depressão do vale das lágrimas.
Sim,
A lembrança do que você fez por mim resgatou-me da minha ignorância e se, mesmo de noite, o dia acorda em mim e me sinto renascido das minhas próprias cinzas, foi porque durante a minha incapacidade de enxergar no céu a luz divina; vi Deus em você e a sintonia foi reestabelecida.
03 de agosto de 2009
Frank Oliveira
http://cronicasdofrank.blogspot.com/