Ressuscitar é possível?
Recordo-me de uma imagem de infância, minha mãe e suas amigas reunidas na sala falando sobre relacionamentos. Falavam sobre seus maridos, seus ex-namorados, seus amores que não deram certo. Eu, ainda pequena ficava escutando escondido o diálogo “dos adultos”, embora anos mais tarde tenha compreendido que elas assumiram responsabilidades, mas continuavam meninas a espera de um príncipe encantado. Cresci e tive minhas próprias amigas e experiências. Tive muito que falar e ouvir porque descobri que sempre que os amores e relacionamentos são os focos principais de uma conversa, é um assunto para muitas horas.
Então, desde a minha infância escuto mulheres falando de amor e desamor. Vejo nas novelas, leio nos jornais, livros, revistas, filmes, o amor e desamor. Quase nunca é discutido com seriedade nos meios de comunicação. Como quase todas as leis capitalistas, “mude o visual” e você conseguirá um amor ou conseguirá esquecer o desamor. Saia, passeie, viaje, vá a festas, mude seu cabelo, emagreça, faça dieta. Se perder um amor, arrume outro para esquecer o anterior. E assim caminha a humanidade. Quando somos adolescentes, isso até funciona. Funciona para arrumar namorado, companhia e não um amor.
Quando somos adultas percebemos um pouco a futilidade das frases de efeito, porém quando amamos realmente, percebemos a futilidade de todas as frases de efeito. Quando descobrimos a emoção de sentir o quanto somos completos, percebemos que a vida é muito mais do que aparência, percebemos que a vida é essência. Porém não é fácil amar, pois isso exige entrega, comprometimento, verdades com as quais não estávamos acostumados a viver. Vivíamos, antes de amar, com sonhos materiais inseridos nas verdades internas. Descobrir que para viver bem precisamos apenas ouvir nosso coração pode ser um baque na fragilizada couraça humana.
O amor pode ser assustador se pensamos sobre ele, mas também pode ser uma experiência maravilhosa e sublime se apenas o vivemos. Nas histórias novelescas sempre que chegamos ao auge do amor, alguma coisa acontece. Na vida isso também ocorre, talvez em forma de teste. Uma das partes abandona o barco por medo, receio, fraqueza, desamor. Uma das partes comprometidas com o amor rompe o elo construído com lutas internas. É ai que vem o verdadeiro teste. O amor é grandioso, forte, maravilhoso, uma força capaz de erguer montanhas. Levamos tanto tempo buscando uma outra parte que nos complementasse e nos fizesse sentir a incrível sensação de amar, como ficar novamente solitários? Primeiro vem o choro, a raiva, a culpa. Depois vem a solidão e em terceiro vem à morte, em dois sentidos, a morte física e o renascimento.
A morte física acontece com aqueles que perdendo o amor se esquecem de viver e a morte como renascimento vem para aqueles que se lembram que o afeto de alguém partiu, mas que o amor não morreu o amor nunca morre. Ele se transmuta. Ele é tão grandioso que nos abre um leque de novas alternativas. Na falta de alguém para amar podemos amar nós mesmos. Amar com carinho, cuidados, certezas, ternura, contentamentos, alegria, felicidade. Sei que para amar de verdade há de ter muita coragem. Covardes não amam. Sei que lembrar das frases ditas por quem um dia amamos e que de alguma forma nos abandonou é doloroso, muito doloroso. No entanto, se o amor realmente for amor, ele crescerá na forma de frutos recebidos, de afetos demonstrados por amigos, mensagens recebidas. O amor nos ensina o melhor da vida, nos ensina a amar nós mesmos fortalecendo a auto-estima, o amor, quando é amor nos ensina a não aceitar sermos agredidos e humilhados, nos ensina a ir atrás de verdades inteiras e não mais meias-verdades. O amor nos ensina que somos privilegiados por ter tido, por ter em algum momento de nossas vidas recebido a incrível capacidade de amar. O verdadeiro amor nos ensina que somos merecedores de felicidade. Passado o tempo das lágrimas, a ressurreição acontecerá e o negro do luto e da dor vai embora. Às vezes leva um tempo para absorvermos todos os ensinamentos que o amor nos trouxe e nessas horas lembremos que o tempo é o senhor de tudo.