a corrida maluca
A corrida maluca
Assistir a um desenho animado é uma delícia, principalmente aquele que nos dá a liberdade de viajar e nos transformarmos em heróis e vilões, fazendo parte daquele universo só nosso. A corrida maluca é um desses atrativos que há muito tempo provocam tal poder de mutação, com as máquinas roncando na sequiosa vontade de vencer.
É claro que, também, às vezes me faço de julgador ferrenho e questiono as regras, por aceitarem ainda a participação de Dick Vigarista e Mutey, seu assistente risonho. Esses birutas pilotantes possuem as mais variadas personalidades: Penélope Charmosa, Peter Perfeito, Rufus Lenhador e Dentes de Serra, o carro tanque do sargento Bombada, a Quadrilha de morte, o Professor Aéreo e suas invenções malucas, os Irmãos Rocha, o Cupê mal assombrado, Tio Tomaz e Chorão.
Eles correm, correm, chuvas e sóis, pântanos e areias que surgem do nada... São apenas alguns dos percalços enfrentados por esses corredores. No último sábado, por infelicidade do destino, o nosso mais bem sucedido piloto de Formula l, Felipe Massa, sofreu um acidente originado justamente no carro do ex-piloto da Ferrari Rubens Barrichelo.
Faço esta analogia com a Corrida maluca por ser uma coincidência desastrosa, cômica se não fosse trágica... Numa festinha de aniversário do pequeno Mateus, levei meus lápis aquareláveis e me posicionei estrategicamente para pintar os ilustrinhos chegantes com desenhos animados, nomes pessoais e até escudos de times de futebol. Para minha surpresa, cariocas e paulistas estão cada vez mais presentes, entre eles pequenos torcedores.
Entre um colorido e outro, alguém se lembrou do acidente. Eu, querendo sugar um pouco dessa gostosa fantasia, me atrevi a perguntar como tinha acontecido. Dos comentários, escolhi um que motivou esta crônica: Pedro, que tem cinco anos e é amigo do aniversariante, me disse que Rubinho é Dick vigarista. Sorri e quis saber mais; ele, como se contasse um segredo, me falou quase ao pé do ouvido que o ex-piloto da Ferrari mandou construir um carro que atira molas, e correu tão forte que passou na frente de Felipe Massa. Só que, quando sentiu que ia ser ultrapassado, apertou um botãozinho e a mola bateu na testa do outro.
Bestificado com a versão empolgante, deixei a fila estagnada por muito tempo, e tentei extrair mais daquela história lúdica. Disse-me ainda que Barrichello queria que todo mundo cantasse parabéns para ele e desse-lhe o bolo de aniversário.
Concluí a pintura de carro de corrida em seu braço e fiquei imaginando: tantos pilotos que correm em seus circuitos para chegar aonde talvez nem eles mesmos saibam realmente... Ganhar muito dinheiro, creio que a maioria já ganhou, mas e o frustrante sentir que não chega a lugar algum? Quem sabe se na interpretação de Pedrinho, o próprio carro não se sentiria tolhido, afogado em suas lágrimas de corredor, já que foi projetado para velocidades além dos limites dos pobres comerciais que vagam pelas ruas e avenidas das cidades, quando muito em BRs assassinas que os destroçam em paredões de pedras ou se chocam uns com os outros...
Os carros de corrida não aguentam mais as prisões desses GPSs. Ainda que os pilotos birutas façam de tudo para que eles se mantenham em funcionamento, em harmonia com outros competidores, a rebeldia é a estampa dos carros. Que até os próprios pneus estão lançando para demonstrar as insatisfações. Que todas as forças sejam unidas e os deuses da mitologia se unam ao Deus dos cristãos e que todos os pedidos para recuperação do Felipe Massa sejam atendidos, pois esse povo que perdeu Airton Senna depositou suas esperanças no “trapaceiro atirador de molas”, e se decepcionou com tanta lentidão.
E viva Felipe Massa! Para que a Corrida maluca continue nos dando motivos para vê-la.