Veneziana.

Da minha janela não tenho a graça do por do sol.

Lá em baixo não passa banda.

Não tem como por travesseirinho pra repousar

Os cotovelos e ficar olhando pra inquietude da vizinhança.

Tem grades que acumulam pó. (ela toda acumula pó)

Passarinho nenhum vem dar o ar da graça.

É, tem dia que é ruim pra abrir, dá uma emperrada de leve

Que não chega a me irritar, mas dá uma perturbação.

Ela não tem sensores e laser exterminador de pernilongos.

Ah! Entra um pouco de vento por ela sim,

Mas não entra luz do sol de manhazinha

Por fresta nenhuma fazendo aqueles filetes de luz amarelo ouro

Onde a gente pode ver quanta coisinha miúda

Fica voando no ar e a gente não percebe.

Não tem como desenhar no vidro quando embaça.

Não tenho como pular, mesmo que eu não tivesse a vergonha

De passar pelo vexame de morrer tão novo.

Vasinho com margarida? Tem jeito não.

Nem de contemplar o esplendor da lua

Mesmo nas noites mais estreladas de inverno.

Não tenho tranças pra jogar, mas até aí a culpa não é dela,

Mas também não teria como jogar mesmo se eu tivesse.

Não é amarelinha, nem azul, nem verde.

Que sem graça! Minha janela não tem poesia nenhuma.