Amor maduro
Águida Hettwer
 
 
    Até parece que foi ontem que brincávamos de ciranda, os cânticos ainda ressoam vozes de infância. Momentos enfeitaram a face de marcas, fingimos não seguir a linha do tempo. As mãos calejadas guardam sinais, entrelaces de vidas. Ainda o olhar busca a serenidade que falta no palavrear.
 
   Os passos perderam o vigor, mas não perderam o rumo. Apoiando-se no largo ombro, como se ainda ouvisse histórias onde o final é feliz. Contando segredos, com um gesto, ajeitando os prateados cabelos, feito sonhos que não deixou morrer por medo.
 
 Sondando os anseios, como quem virando uma página, dá continuidade ao assunto. Uma releitura da alma, com direito a novos traços e siglas. Há tanta doçura nos lábios, pedindo atenção, há tanto desejo insistindo a aflorar. Infusão de maturidade e rebeldia no ato de amar.
 
 Enquanto um descansa em sono reparador, o outro, aconchega sonhos na pálpebra. No salão da imaginação, são apenas duas áureas a bailar. Nenhum vestígio foi apagado, há digitais no corpo, das noites onde adentravam em carícias.
 
 No amor maduro, perdura a compreensão, há pausa entre as vírgulas, descrição nos comentários, sabedoria nos atos, reticências nos olhar. Onde os relacionamentos não precisam ser discutidos, apenas carecem de colo e conforto de ideias.
 
  Em zelo impermeável, abotoa-se o casaco, como se fosse de um filho. Agasalham-se com ternura um ao outro, inclinam-se para beijar novamente, para retardar a despedida.
 
  No auge do frescor desse amor, a natureza contribui, no perfume delicado da flor, no barulho da chuva batendo no telhado, no sol que se espreguiça cedo, cultuando a vida, as cores e os amores que não morrem nas trocas das estações.
 
 Um amor assim, como diria o poeta, que fascina e encanta não se desfaz em detalhes, sem ser extremista, pede licença e adentra. Refaz-se no amor, sendo espelho da sua própria existência.
 
 
 
27.07.2009