A lua
no beijo
e na canção
1. Da varanda do meu quarto, vejo a lua em todas as suas fases e dimensões. De repente ela aparece graciosa, lá pros lados de Itapoã. E em questão de segundos, envolve-me num abraço prateado e amoroso.
2. Se a noite é de plenilúnio, logo me lembro dos versos de Artur Azevedo sobre o luar de sua terra natal, o Maranhão.
No seu conto em versos A Nuvem, diz o espirituoso contista maranhense: - "Que luar o luar do Maranhão!/ Dir-se-ia/ Um belo meio-dia./ Iluminado por um sol sem fogo!"
3. Óh! Nem sei dizer em quantas serestas a lua foi minha companheira. Confiava-lhe os meus segredos - eu um adolescente sonhador - e não hesitava em lhe falar dos meus queixumes.
- "Só tu dormes não escutas/ o teu cantor/ revelando à lua airosa/ a história dolorosa desse amor."
- " Lua, manda a tua luz prateada/ despertar a minha amada/ Quero matar meus desejos,/ Sufocá-la com meus beijos..."
4. Lua, minha mensageira nas madrugadas velhas... já tão distantes... Tempo em que ainda não se falava em corrida espacial. Ir à lua? Nem pensar. Não, a lua era dos poetas, dos compositores e principalmente dos namorados. E de mais ninguém.
5. Eu pergunto: o leitor, por acaso, já ouviu falar em "boca de luar"? Carlos Drummond de Andrade criou-a em uma de suas inconfundíveis prosas, bolando uma conversa entre dois mineiros enamorados.
_ "Você tem boca de luar, disse o rapaz a namorada, e a namorada riu, perguntou ao rapaz que espécie de boca é essa, o rapaz respondeu que é uma boca toda enluarada, de dentes muito alvos e leitosos, entende? Ela não entendeu bem e tornou a perguntar, desta vez que lua correspondia à sua boca, se era crescente, minguante, cheia ou nova. Ao que o rapaz disse que minguante não podia ser, nem crescente, nem nova, só podia ser lua cheia, uai."
E a namorada contornando um momento de arrufo do seu parceiro: ..."boca de luar é legal, olha aqui, vou te dar um beijo superluar, você quer?"
Beijo superluar! Só na cabeça prodigiosa do Drummond que o imaginou possivelmente em uma noite enluarada de sua querida Copacabana, se lembrando da sua Itabira.
6. Julho de 2009. Estou vendo o mundo comemorando os quarenta anos da "conquista da lua". Volto a este assunto para dizer que ainda há muita gente que não acredita nessa história.
7. Seu Pedro, o frentistas que me dá apoio num posto de gasolina, cá na Pituba, perguntou-me se é verdade que o homem "andou pisando no chão da lua". Disse-lhe que in-fe-liz-mente tal coisa acontecera. Em seguida, passei-lhe algumas informações sobre a chegada do homem no nosso satélite.
8. Contei-lhe que, quando eu tinha 35 anos, em 20 de julho de 1969, três camaradas corajosos chamados Neil Armistrong, Buzz Aldirn e Michael Collins pousaram suavemente no território selenita. Inesquecível espetáculo!
9. E num português bem acessível, dada a sua evidente limitação intelectual, fiz ver ao Pedro que a tal corrida rumo ao espaço sideral começara com o lançamento de três Sputiniks pelos russos, dois dos quais levando, no seu interior, primeiro a cadelinha Laika e depois um sujeito, ímpio de nascença, chamado Yuri Gagarin, que voltou do céu dizendo, com ironia, não ter visto Deus.
10. E que coube aos norte-americanos desembarcar no chão da lua, fincando no solo lunar a bandeira dos Estados Unidos. Seu Pedro ouviu tudo, mas com a cara de quem estava escutando uma enorme mentira. Deixemos que ele pense assim.
11. Ele, talvez, tenha desejos iguais ou parecidos aos do rabiscador destas linhas, ou seja, que a lua permaneça intocável; que seja, apenas, fonte inspiradora dos prosadores românticos, dos poetas, e de compositores apaixonados.
12. Que ela continue inspirando versos com estes: "A lua é um disco em que o Criador gravou uma canção/ Tocada pelos anjos num conjunto/ numa grande orquestração", que tirei de Prelúdios de Sonata, página musical magistralmente interpretada pelo alagoano Augusto Calheiros.
13. Ou versos como estes de Chão de Estrelas : "A porta do barraco era sem trinco/ Mas a lua furando o nosso zinco/ Salpicava de estrelas o nosso chão..."
14. Que ela continue sendo chamada de:
"a soberana de prata";
a "protetora dos amantes";
a "deusa da serenata";
"ornamento do sem fim";
"guia do amor seresteiro".
15. Que não perca a majestade que lhe emprestou Catulo da Paixão Cearense, em Luar do Sertão: - "A gente fria/ dessa terra sem poesia/ não se importa com essa lua,/ nem faz conta do luar!/ Enquanto a onça/ lá na verde capoeira/ leva uma hora inteira,/ vendo a lua a meditar."
16.Talvez seu Pedro queira o que, afinal, também quer este cronista, ou seja, que deixem a lua em paz.
Lembro-me que ao surgirem os primeiros rumores de uma possível viagem do homem à lua, Ângela Maria, em uma canção de advertência, cantava assim: "Todos eles estão errados/ A lua é dos namorados."
Que ela nunca deixe de ser dos amantes.
no beijo
e na canção
1. Da varanda do meu quarto, vejo a lua em todas as suas fases e dimensões. De repente ela aparece graciosa, lá pros lados de Itapoã. E em questão de segundos, envolve-me num abraço prateado e amoroso.
2. Se a noite é de plenilúnio, logo me lembro dos versos de Artur Azevedo sobre o luar de sua terra natal, o Maranhão.
No seu conto em versos A Nuvem, diz o espirituoso contista maranhense: - "Que luar o luar do Maranhão!/ Dir-se-ia/ Um belo meio-dia./ Iluminado por um sol sem fogo!"
3. Óh! Nem sei dizer em quantas serestas a lua foi minha companheira. Confiava-lhe os meus segredos - eu um adolescente sonhador - e não hesitava em lhe falar dos meus queixumes.
- "Só tu dormes não escutas/ o teu cantor/ revelando à lua airosa/ a história dolorosa desse amor."
- " Lua, manda a tua luz prateada/ despertar a minha amada/ Quero matar meus desejos,/ Sufocá-la com meus beijos..."
4. Lua, minha mensageira nas madrugadas velhas... já tão distantes... Tempo em que ainda não se falava em corrida espacial. Ir à lua? Nem pensar. Não, a lua era dos poetas, dos compositores e principalmente dos namorados. E de mais ninguém.
5. Eu pergunto: o leitor, por acaso, já ouviu falar em "boca de luar"? Carlos Drummond de Andrade criou-a em uma de suas inconfundíveis prosas, bolando uma conversa entre dois mineiros enamorados.
_ "Você tem boca de luar, disse o rapaz a namorada, e a namorada riu, perguntou ao rapaz que espécie de boca é essa, o rapaz respondeu que é uma boca toda enluarada, de dentes muito alvos e leitosos, entende? Ela não entendeu bem e tornou a perguntar, desta vez que lua correspondia à sua boca, se era crescente, minguante, cheia ou nova. Ao que o rapaz disse que minguante não podia ser, nem crescente, nem nova, só podia ser lua cheia, uai."
E a namorada contornando um momento de arrufo do seu parceiro: ..."boca de luar é legal, olha aqui, vou te dar um beijo superluar, você quer?"
Beijo superluar! Só na cabeça prodigiosa do Drummond que o imaginou possivelmente em uma noite enluarada de sua querida Copacabana, se lembrando da sua Itabira.
6. Julho de 2009. Estou vendo o mundo comemorando os quarenta anos da "conquista da lua". Volto a este assunto para dizer que ainda há muita gente que não acredita nessa história.
7. Seu Pedro, o frentistas que me dá apoio num posto de gasolina, cá na Pituba, perguntou-me se é verdade que o homem "andou pisando no chão da lua". Disse-lhe que in-fe-liz-mente tal coisa acontecera. Em seguida, passei-lhe algumas informações sobre a chegada do homem no nosso satélite.
8. Contei-lhe que, quando eu tinha 35 anos, em 20 de julho de 1969, três camaradas corajosos chamados Neil Armistrong, Buzz Aldirn e Michael Collins pousaram suavemente no território selenita. Inesquecível espetáculo!
9. E num português bem acessível, dada a sua evidente limitação intelectual, fiz ver ao Pedro que a tal corrida rumo ao espaço sideral começara com o lançamento de três Sputiniks pelos russos, dois dos quais levando, no seu interior, primeiro a cadelinha Laika e depois um sujeito, ímpio de nascença, chamado Yuri Gagarin, que voltou do céu dizendo, com ironia, não ter visto Deus.
10. E que coube aos norte-americanos desembarcar no chão da lua, fincando no solo lunar a bandeira dos Estados Unidos. Seu Pedro ouviu tudo, mas com a cara de quem estava escutando uma enorme mentira. Deixemos que ele pense assim.
11. Ele, talvez, tenha desejos iguais ou parecidos aos do rabiscador destas linhas, ou seja, que a lua permaneça intocável; que seja, apenas, fonte inspiradora dos prosadores românticos, dos poetas, e de compositores apaixonados.
12. Que ela continue inspirando versos com estes: "A lua é um disco em que o Criador gravou uma canção/ Tocada pelos anjos num conjunto/ numa grande orquestração", que tirei de Prelúdios de Sonata, página musical magistralmente interpretada pelo alagoano Augusto Calheiros.
13. Ou versos como estes de Chão de Estrelas : "A porta do barraco era sem trinco/ Mas a lua furando o nosso zinco/ Salpicava de estrelas o nosso chão..."
14. Que ela continue sendo chamada de:
"a soberana de prata";
a "protetora dos amantes";
a "deusa da serenata";
"ornamento do sem fim";
"guia do amor seresteiro".
15. Que não perca a majestade que lhe emprestou Catulo da Paixão Cearense, em Luar do Sertão: - "A gente fria/ dessa terra sem poesia/ não se importa com essa lua,/ nem faz conta do luar!/ Enquanto a onça/ lá na verde capoeira/ leva uma hora inteira,/ vendo a lua a meditar."
16.Talvez seu Pedro queira o que, afinal, também quer este cronista, ou seja, que deixem a lua em paz.
Lembro-me que ao surgirem os primeiros rumores de uma possível viagem do homem à lua, Ângela Maria, em uma canção de advertência, cantava assim: "Todos eles estão errados/ A lua é dos namorados."
Que ela nunca deixe de ser dos amantes.