Nos limites do vento

O silêncio do inverno, quebrado pelo uivo dos ventos, agita a memória retrospectiva. Preenche o vazio quando nada rigorosamente ocorre nesse ambiente com hálito de geleira. Nesse cenário disputávamos uma cadeira no cinema gelado. O Cine Teatro Independência era o único do extremo sul. Só o poder das imagens esquentava os nossos sentidos subtropicais. Um certo sarcasmo se deve ao fato da energia elétrica ser o fruto dos motores a diesel nesse período cinematográfico. Muitas vezes ficávamos no escuro da sala, berrando graciosamente, até o projetor receber luz novamente e abençoar a película com sua magistral ação de nos iludir até o final do espetáculo.

Quando chegou a linha da energia elétrica, após sacrifícios e discursos, levando claridade aos recônditos rincões, o cinema do interior urbano pifou. Justo quando havia ficado teoricamente mais fácil. É importante compreender o seguinte: uma sociedade anônima por ações, com o nome de cinema, funcionava eletricamente com a força dio diesel. É como se um bom óleo impulsionasse o motor da imaginação. Nossa imaginação nos limites do vento.

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Fugindo dos raciocínios aritméticos e do gelo, fiquei feliz graças à sensibilidade do prefeito no que diz respeito à ampliação das férias de julho até certo dia ainda não confirmado. Assim a gripe maligna ( a pandemia da fome não importa, nem atemoriza) vê nosso esforço nesse período glaciário.

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Saibam que o que torna um clima refrescante, depressivo, é a cor cinza do humor. Colorir devia ser lei nesses ambientes. Seja como for,não vamos assistir as crianças da área rural, beirando estradas, tiritantes, para alcançarem as escolas. Mas o que me deixa desprovido de entendimento é o fato das medidas serem tomadas como paliativo dessa suposta pandemia. Sem pandemia ninguém daria importância aos pés enregelados dos nossos brasileirinhos.

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Sem exagero, após quatro dias de vento apressado é de se rogar o verão. Confesso que vou me ajoelhar ao mirar à primeira andorinha vestida com sua saída-de-banho preta sobre o branco no céu austral. Vir aqui no inverno requer muito agasalho.

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Olhando em retrospectiva tomamos um susto ao imaginar às palmeiras como abrigo dos aborígenes mais arcanos. Sobretudo resta-nos um retrato simplificado dos primeiros expulsos do paraíso, além de amor pela ternura das lãs. Aliás, palmeiras devastadas, hoje quase inexistentes que deram ao município o pouco exemplar nome de Palmar, como coletivo no singular, para esse vazio ecológico.

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Longe dos aborígenes arcanos a pele nua sofre atualmente a crueldade dos números, pois são os algarismos que não cobrem de agasalho a totalidade das alminhas.

Santa Vitória do Palmar.