Jogando a culpa no ventilador
"Todo plano que conta com a participação de terceiros é fadado ao fracasso"
Se não me falha a memória, foi Napoleão Bonaparte quem imortalizou a frase que tão bem expressa a visão de muitas de nós - mulheres modernas - frequentemente acusadas de sermos individualistas e perfeccionistas – como se isso fosse um crime. Já diz o jargão: "quem manda melhor faz". Pior seria jogar tamanha exigência sobre os outros, não é mesmo? Mas, "cá pra nós", às vezes acontece... E há momentos na vida em que o jargão ganha razão:
Exemplo 1: Você passou dois anos sem cortar o cabelo, virando uma verdadeira Rapunzel, só para poder fazer aquele corte descolado que viu na revista e quando enfim resolve cortar, vai ao melhor cabeleireiro, explica direitinho e pressupõe que ele entendeu - afinal ele disse "ahãm" três vezes enquanto você explicava - pois bem, basta uma tesoura afiada e um cabeleireiro distraído para, em dois segundos transformar seus dois anos de planejamento em dois meses de frustração!
O jeito é evitar o espelho nos primeiros dias e não bater nas amigas que ficam repetindo "ficou até melhor assim" ou "cabelo cresce" – Respire fundo e espere: com tempo e paciência elas acabam ganhando razão!
Exemplo nº2: Desde sempre você planeja o seu casamento; muito antes de haver um noivo – até por que "ele" não tem nada a ver com isso, já prestou a atenção? É o vestido de noiva, a lista de noivas, o bolo da noiva - o noivo é só um coadjuvante, quase um adereço, entre as flores e os arranjos de mesa – e não é menosprezo não: escolhê-los é tão difícil quanto!
Até que um dia – enfim – chega o grande momento...
Por melhor que seja a equipe de trabalho ou a promoter contratada, por mais claro que você tenha explicado, desenhado e esquematizado pra todo mundo, "mais de um milhão de vezes", onde ficar, como chegar e principalmente: a que horas - por mais perfeito que você possa visualizar a cerimônia, quando isso passa da sua mente para a de outros, é como brincar de telefone sem fio...
No fim das contas sempre tem alguém que erra - o horário, a igreja, o nome do noivo, o bom gosto, a dose - E aí fazer o que? Chorar até borrar a maquiagem, inchar os olhos e ficar eternizada "na fita e na foto" com aquela cara de "noiva cadáver"?
Relaxe, pra tudo na vida existe um jeito.
Edite: o filme e as memórias – delete tudo aquilo que lhe incomoda e dê destaque para o que lhe faz feliz!
Se nos deixarmos abater (ou traumatizar!) por estas pequenas e grandes decepções, somadas a correria de um cotidiano conturbado por tarefas domésticas e profissionais, nos tornamos cada vez mais individualistas. E a linha entre a autosuficiência por satisfação e por desconfiança é tão tênue que nem sentimos ao atravessá-la.
Perseguimos a perfeição – seja nas tarefas do dia-a-dia, nos outros, ou em nosso próprio corpo - mesmo sabendo que é ilusão, além de uma tremenda autoflagelação! Como o cachorro que late perseguindo a roda de um carro - você já se perguntou o que faria se um dia a alcançasse? Provavelmente nada, pois perderia toda a graça, a emoção que mora na incerteza, na possibilidade da falha, na surpresa que leva ao improviso e faz das memórias ainda mais especiais.
O cabelo que você não planejava usar e agora arranca olhares inusitados; aquelas férias na praia, quando choveu o tempo inteiro e vocês acabaram passando muito mais tempo juntinhos; as passagens tão cômicas que só existem na filmagem do seu casamento porque as pessoas fugiram do planejado – tudo depende do ponto de vista, da tradução - ao invéz de ‘"eu tudo errado", por que não "foi surpreendente", "foi inovador"!
Além disso, é humanamente impossível fazer tudo sozinho – mesmo para nós mulheres "multiuso" – algum detalhe sempre acaba negligenciado e quanto antes você se convencer desta verdade e, eventualmente confiar em mãos alheias, mais leve ficará o peso sobre o seus ombros e se bobear sobra até um tempinho para amar mais – aos outros e a si mesma! E quando algo sair "de forma inesperada" não culpe a si mesma! Que tal jogar a culpa no ventilador? Deixe voar, dispersar, assim vai um pouquinho pra cada lado e não pesa muito pra ninguém!
Eu por exemplo, não estou certa de que a frase inicial foi mesmo dita por Napoleão, mas, se não foi, bem que poderia ter sido...
A culpa não é minha!
*Publicada no Jornal Agora (Rio Grande- RS) em Janeiro de 2009.