Sorrisos em pleno voo


          1. No avião que me trouxe ontem do Rio de Janeiro, as aeromoças sorriam o tempo todo! Sorrisos discretos e distribuídos equitativamente com os demais passageiros,  a maioria tendo como destino a velha Bahia.  
           2. O sorriso de cada uma delas me dava a sensação de que o voo transcorria na mais perfeita normalidade. Sabia, entretanto, que nem sempre o sorriso da aeromoça é a garantia de que, na cabine do comandante, está tudo correndo as mil maravilhas. 
          3. A aeromoça é treinada para não apavorar os passageiros, mormente os passageiros covardes, como este escriba de tantos voos. 
          4. A verdade é que, em nenhum momento as vi sisudas, preocupadas, assustadas. Nem quando o avião, passando por Minas Gerais, enfrentou uma preocupante turbulência.
           5.  "Minha profissão me ensina a não semear o pânico". Foi o que ouvi de  uma aeromoça em um agradável papo que travamos entre Salvador e Lisboa, exatamente quando o avião atravessava uma apavorante "área de instabilidade" e eu tremia de medo.
          6. E não adianta me dizerem que os aviões são projetados para enfrentar turbulências.
     
 Não tem essa: balançou, e logo penso que nem os meus santos protetores - com os quais me agarro durante os voos - evitarão a queda da aeronave.
          7. Pois é. No avião que me trouxe ontem à tarde do Rio para Salvador, do meu canto, com um olho no céu e o outro na terra, eu me denunciava, mais uma vez, encantado com o sorriso dessas meninas que já foram chamadas de aeromoças. Hoje, chamam-nas de comissárias de bordo.  

          8. Comissárias de bordo, perdão, não devem ser chamadas essas corajosas damas do espaço; que mereceram de Carlos Drummond de Andrade uma belíssima crônica e de Manuel Bandeira um lindo poema. 
          9. Para Drummond, o céu é das aeromoças (ele assim as chama), "de seus amigos aeronautas, e dos pássaros, em condomínio". Ressaltando o saudoso poeta de Itabira que a ausência delas torna os voos "cacetes". Concordo.
          10. E Bandeira, num poema delicado, louva as aeromoças, cantando-lhes os sorrisos - "Ó sorrisos bonitos/ de chegada e partida nos aeroportos". 
          11. Chamando-as de "flores da altura", Manu pede à Virgem Maria, em versos comoventes, um dia do seu mês, maio, o último, "para que nele cantemos, louvemos, festejemos, agradeçamos/ O cotidiano heroísmo, a graça, a bondade das aeromoças".  O dia 31 de maio é o dia da aeromoça. 
          12. Guardei esta crônica na minha memória, enquanto voava; mas com o propósito de rabiscá-la, tão logo estivesse em terra; é o que acabo de fazer... 
          13. Às aeromoças que, por acaso, me encontrarem nesta crônica, como Drummond, desejo-lhes um carinhoso "Bom céu!"
        
        
 
 
Felipe Jucá
Enviado por Felipe Jucá em 23/07/2009
Reeditado em 05/11/2019
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