OUTONO

De repente me vejo sentada debaixo da velha árvore desenhando uma sombra que me cobre e centenas de folhas de outono. Elas têm a cor amarela do tempo. Quase sempre mescladas da cor parda e têm um ritmo de fazer inveja aos mais prodigiosos coreógrafos. Quanta leveza! E o vento tem um acorde quase silencioso. Mas eu o sinto enquanto fecho os olhos. Há uma atração quase fatal entre eu e o outono. Entre eu e a velha árvore...

No outono passado aqui estive e desenhei a crônica desta velha árvore. Não falei do outono, mas ele inspirou-me nas palavras que nasceram. Sim, falei da velha árvore. Sua imponência. Fantasiei meu retorno a sua velha sombra que me envolvia qual uma música de retorno após tanto tempo. Justifiquei minha ausência. Falei de minhas correrias pela vida. Aqui mesmo encostada ao velho tronco senti a leve brisa dessas manhãs que antecedem o inverno. Lembrei a infância... Martirizei meus pensamentos... Refiz a eterna viagem ao passado.

Porque teimo em fazer essas viagens? Não tinha eu decidido não mais lembrar? Porque teimo em reviver momentos, lembrar pessoas, as coisas de minha infância? Que sentido teria um passado depois de quarenta anos? Talvez eu tenha me perdido nessas constantes buscas na vida. Nada encontrei certamente. E numa curva qualquer olho o que antes formaram as minhas pegadas. Hoje não quero ignorá-las e tenho medo que o pó da estrada as apague antes que eu as refaça como memórias.

Hoje a velha árvore me acolhe. Afago sua sombra e me encolho de encontro ao seu tronco. Porém, desta vez não quero desenhá-la em crônicas, embora eu sinta a ânsia de meus dedos. Não quero formar palavras de outono amarelos e pardos. Apenas sentir essa leve brisa, o farfalhar das folhas da velha árvore... O trinado dos pássaros que lhe disputam os galhos. Dentro de mim ouço esse farfalhar. São as memórias... Elas agitam qual o vento de outono, qual as folhas que dançam a sua coreografia mais bela.

Sonia de Fátima Machado Silva
Enviado por Sonia de Fátima Machado Silva em 07/06/2006
Reeditado em 16/12/2008
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