VOCÊ TEM MEDO DE PERDER O CONTROLE?

Luisa quis falar e seu pai a interrompeu dizendo:

- Você fique quieta, porque agora criança aqui não fala mais!

Ela tinha seis anos e estava querendo dizer ao pai que não tinha pensado em desrespeitá-lo quando comentou sobre o fato de ele não ter lavado as mãos antes do almoço. Ela somente quis dizer a ele o que sempre diziam a ela, não conseguia captar que isso pudesse ser algo ruim e deixá-lo irritado.

Mais tarde, aos doze, algumas iniciativas lhe foram simplesmente proibidas sem que ela entendesse a razão. E, na verdade, a razão era somente o medo daquele pai de perder a autoridade, uma vez que ele não conseguia conquistar o respeito dos filhos e estava sempre inseguro de sua posição de líder do grupo familiar.

Quando adolescente, teve um professor que não se mostrava rígido, nem metódico, nem impunha o seu ponto de vista sem questionamentos e ela então sentiu-se perdida pois nunca havia sequer tentado caminhar com as próprias pernas, já que tudo devia ser decidido pelos adultos. Tal como alguém que, após muitos anos em trabalho escravo, ganha de uma hora pra outra a liberdade. Como aquele pássaro que ao ser aberta a gaiola enfim, não consegue sair. Passou então à total irreverência, causando problemas sérios de agitação nessas aulas, uma vez que além da sua confusão, a sua idade não lhe dava suporte para vivenciar tal contexto. Ainda mais porque na mesma escola havia professores que mantinham os alunos sob intensa vigilância e sem ter oportunidade de tomar nenhuma iniciativa.

Já adulta, era uma admiradora de pessoas que se diziam livres e dava-se ares de pessoa da melhor convivência, amável e tão cônscia de sua suposta generosidade, mas quando em situação de comando, de modo oposto ao que aparentava, algo acontecia: entrava em pânico se percebia alguém que se desse conta e tentava expor idéias que ela intuía como causadoras de um movimento perigoso de insubordinação. Trocando em miúdos, ela cortava qualquer tentativa de debate ou troca de idéias, uma vez que sentia que isso era algo que poderia fugir ao seu controle e dar chance a outra pessoa de roubar o foco de atenção.

Estava, assim, reproduzindo o modelo autoritário da família e da sociedade em geral, aonde o receio era traduzido como respeito; o controle como o zelo pela ordem; a intolerância, como o direito de veto.

Muitos de nós repetimos comportamentos autoritários na vida diária sem mesmo dar-nos conta, uma vez que nosso modelo de educação tem sido eminentemente castrador, e a natureza humana subjugada por séculos , sob regras ditas divinas como também humanas, de forma a organizar a sociedade para aceitar docilmente a submissão. Para isso era imprescindível deixar a sexualidade sob a camisa de força especialmente via religião cristã, edificada sobre princípios e normas que em nada apresentavam a primitiva doutrina do profeta Jesus e por séculos sendo instrumento de poder sobre os povos, primeiro da Europa, depois das colônias das Américas.

Daí o imenso pavor quando uma pessoa, moldada em posturas reacionárias encontra alguém que parece não se sensibilizar com a sua figura dilatada por um espelho de vaidades e insegurança. Tal perigo é detectado instintivamente por quem tem o comando e como é imaturo, uma vez que não teve chance de construir uma personalidade livre e autoconfiante, como o caso de Luísa, vê na postura do outro uma ameaça a sua posição e trata logo de se livrar do incômodo.

tania orsi vargas
Enviado por tania orsi vargas em 18/07/2009
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