Gráficos pornográficos
 


          Hoje pela manhã, ouvi pelo rádio do carro que o atropelamento de um ciclista numa das movimentadas vias de São Paulo complicava ainda mais o trânsito que costumeiramente já é congestionado. No ensejo de tal notícia, eram sugeridas aos motoristas rotas alternativas de trânsito para aquela região específica da cidade.

          Segundo as estatísticas oficiais, ano passado, na capital paulistana ocorreram quase mil e quinhentas mortes por acidentes de trânsito; destas, pouco menos de setecentas por atropelamentos e, destes, um pouco mais de cinquenta foram de ciclistas. Ainda, há registro de que os ciclistas que morrem no trânsito de São Paulo representam zero vírgula alguma coisa por cento da frota total de veículos em circulação.


          Pois é! Aqui em São Paulo as pessoas que morrem no meio do trânsito dariam para encher alguns Airbus por ano, como aquele da Air France que tragicamente caiu há pouco tempo. Só que as mortes em massa e em acidentes de apelo cinematográfico chamam muito mais a atenção e causam maior comoção. A tragédia no trânsito paulistano é distribuída a conta-gotas por entre as marés de eventos fatais. E tudo isso se perde num mar de gráficos, percentuais e outros que tais estatísticos.


          Não por outro motivo, notícia por aqui é o agravamento de congestionamentos e não a morte de ciclistas. E esse, em particular, que foi-se num trágico atropelamento hoje pela manhã,  passará a integrar um gráfico qualquer que banaliza a vida humana. Mais que um gráfico, pelo seu teor de absoluta insensibilidade, será pornográfico.