NA ROÇA - I
Às vezes lamento não saber desenhar uma maçã. Frequentemente lamento não ter o talento necessário, indiscutível e imprescindível para descrever a beleza daquele céu.
O sol, depois de ter proporcionado um belo dia de calor morno e brilho intenso já estava se despedindo e uma enorme lua prateada apontava no horizonte.
Não sei descrever a tintura exata daquele belíssimo pôr do sol. Arrisco-me a dizer que lembrava a cor de cobre. Lindo, muito lindo !
Ao mesmo tempo em que o sol se despedia a lua chegava e inundava aqueles campos de uma cor prateada intensa e, como se fosse uma incrível e enorme platéia, milhares de estrelas começaram a piscar ao mesmo tempo. Dava a impressão de que estavam aplaudindo nossa presença.
A noite chegava trazendo aquele ar fresco com cheiro de grama molhada e ao longe, via-se os contornos dos morros que com aquela luminosidade formavam curiosas figuras . Não pude deixar de sorrir.
O latido dos cães fez com que eu despertasse daquele devaneio. Eu estava simplesmente deslumbrado com aquele espetáculo que a natureza proporcionava. Agora, pareciam milhões e não milhares de estrelas que piscavam. Com certeza estavam enviando sinais de boas vindas.
Estávamos na roça e acabáramos de cruzar as porteiras daquele sitio acolhedor. Os cachorros nos recepcionaram alegremente e pulavam nos festejando como se fossemos velhos conhecidos.
Muitos abraços apertados, crianças correndo ao nosso redor querendo saber das novidades e respirando aquele ar puro, sentindo aquele cheiro de pradarias e montanhas, coloquei instintivamente a mão no meu peito tentando segurar o coração, que naquela altura pulsava muito mais forte.
Estava nas minhas raízes. O tempo pode passar, podemos conhecer outras pessoas, fazer novos amigos, disfarçar nossa brejeirice com roupas de shoppings e das liquidações, perder um pouco do sotaque mas, pelo menos quando piso naquela terra passo a encarnar o caipira que fala engraçado e me junto àquela gente simples que adora prosear e contar causos.
Às vezes não consigo entender porque as pessoas alegam ter tanta dificuldade em encontrar o paraíso. Sei de várias que inclusive nem acreditam que o paraíso exista. São os que estão contaminados pelo fracasso , pelo desânimo e o pessimismo. Bem, para inicio de conversa, o paraíso está dentro de nós mesmos.
É só ficar em sintonia com a natureza, com as coisas simples e maravilhosas que a vida oferece, sentir o cheiro de grama molhada, pisar com os pés no chão e comer legumes que são colhidos na horta. Eu sei que nem todo mundo pode fazer isso mas, acreditem, isso é o paraíso.
Um cheirinho gostoso de comida cozida em fogão à lenha inundava o ambiente. Depois de acomodar nossas coisas nos quartos e lavar as mãos fomos convidados para sentar à mesa onde, entre outras coisas, seria servida uma deliciosa sopa de cebolas.
Acompanhando viria aipim cozido e feijão mulatinho com farinha de milho e apetitosas rodelas de pão feito em casa. Como era só um simples jantar, como sobremesa seriam servidos pequenos mamões dourados e na mesa também estavam um pote de mel, além de queijo branquinho com goiabada cascão.
Não consegui resistir a tentação e provei dois cálices de um licor que estava numa linda jarra transparente bem a minha frente. Como eu disse, o licor estava delicioso e só mais tarde, em animada conversa eu soube que ele era feito de cascas de jabuticabas . Não tenho como descrever a delicia daquela bebida.
Após o jantar fomos para uma espaçosa varanda e em confortáveis cadeiras começamos a colocar as novidades em dia, quer dizer, começamos a prosear.
A conversa desenvolvia-se com incrível naturalidade e bom humor e de vez em quando alguém se engasgava de tanto rir. Eram os causos caipiras, exagerados como sempre, engraçados como sempre.
Pedi licença por um instante e caminhei alguns metros até o centro de um belíssimo jardim que ficava ao lado da varanda. O céu estava admirável e se apresentava a todos nós como mais uma das magníficas obras primas do Criador.
Uma enorme lua prateada, milhões de estrelas piscando e aquela brisa suave, que trazia até o nosso âmago um gostoso perfume de flores silvestres.
Ao longe podia-se ouvir a algazarra dos grilos e , não pude conter o sorriso quando percebi uma quantidade razoável de vagalumes que dançavam em torno de pequenos arbustos.
Não sei por quanto tempo fiquei ali estático, extasiado e perplexo com tanta beleza. Não foi difícil fazer comparações com meu dia a dia.
Sempre corrido, quase sem tempo para olhar as mais simples e mais belas coisas , sempre atento e preocupado com as questões de violência, estresse, enfim, coisas negativas que não existiam em absoluto naquele lugar, naquele paraíso.....
.....continua.....
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(.....imagem google.....)