No mundo poliglota

Depois que a confusão se estabeleceu quando os filhos de Noé construíam a Torre de Babel e viram que falavam línguas diferentes, eles se dispersaram pelo mundo. Mil novecentos e setenta e tantos anos depois, fui eu parar em Paris.

E num domingo, estando na cozinha comunitária da Casa onde vivia, eis que chega um casal de africanos, os dois altos, bonitos, com batas coloridas. Nem prestei muita atenção. Com o olhar perdido através da janela enquanto aguardava as batatas cozinharem, eu pensava na morte da bezerra.Eles descascavam cebolas e não paravam de falar patati, patatá,na língua deles. De repente, mesmo de costas, percebi que entendia alguns comentários.Como era possível?... Eu não conhecia aquela língua!

Confesso que fiquei encafifada, surpresa com essa minha inusitada capacidade, certamente adormecida até então. Seria eu, de agora em diante, capaz de compreender russo, chinês ou grego sem esforço algum? Sem precisar estudar?

Girei os calcanhares, fixei os olhos neles. Apurei os ouvidos. Foi então que fiz uma interessante descoberta: eles falavam em francês! Mas com uma entonação e o sotaque tão diferentes que eu jurava tratar-se de outro idioma...