DE VOLTA AO VELHO RIO

Ontem eu o procurei mais uma vez depois de tanto tempo. As cheias da estação do verão não me deixaram aproximar-me de você. Mas de longe eu o via. Imponente. Suas águas além do normal a seguirem o seu curso numa ferocidade que eu conheço bem. Agora já no outono quase chegando ao inverno, suas águas já não são as mesmas. Muito de seu nível se perdeu nessa sua viagem infinita.

Fui então revê-lo. Aproximei-me bem perto de você. Um misto de medo ainda tomava conta de mim ao ver que suas águas ainda cobriam a pequena ilha, onde tantas vezes andei e onde tantas vezes expus meu corpo ao sol. Mas sentei-me no alto de um barranco e pude vê-lo passar. Majestoso como sempre fora, desde que se tornara obra de Deus. Um vento frio de outono balançava as árvores de sua margem desnudando-as de suas folhas amarelas. Estas dançavam no ar o balé mais clássico que eu já assistira e que tivera o mais trágico dos fins. Seriam levadas pelas águas até um destino que jamais conhecerei. Talvez o mar...

Encolhi-me com o queixo nos joelhos e fiquei a olhar toda aquela natureza que eu tanto conhecia e tanto amava. Lembrei-me das crônicas que lhe fizera e meu primeiro poema e que foi dedicado a você. Pó um instante pensei que suas crônicas seriam infinitas e eu as escreveria tantas quantas quisesse para falar de você velho rio. De suas águas... De sua beleza... E pensar que em todos esses momentos em que as crônicas nasceram eu joguei em suas águas todas as minhas lamentações. Meus sonhos... Minhas desilusões... Sei que me entende...

Hoje mais uma vez me sinto triste. Pensativa. Mas não foi por isso que o procurei. Já sentia saudades. Saudades da sua compreensão silenciosa. Saudades das nossas sessões de psicanálise. Hoje mais uma vez compreendi o quanto o amo velho rio e o quanto me faz bem olhar para você.Falar com você. Ainda que numa linguagem muda e ouvir apenas o barulho de suas águas a correr sempre, como a me fazer entender que a vida é esse eterno caminhar. Esse eterno desaguar...

Sonia de Fátima Machado Silva
Enviado por Sonia de Fátima Machado Silva em 05/06/2006
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