Malandro mesmo é quem rala

Sabe aquelas pessoas que aparecem do nada, não parecem com nada e não lembram ninguém??? Pois foi dessa maneira que ele apareceu na empresa onde eu já trabalhava há três anos, justamente para trabalhar no meu setor, e o pior, como meu encarregado, de cara algo me dizia que nosso sangue não combinava. Olhar empinado, de boa conversa, tipo “Forest Gump”, cheio de histórias, sempre contando vantagem, o famoso “malandro”.

E para não falarem que se tratava de cisma minha, outros colegas de produção também não viam nele um bom encarregado, e para não dizerem que se tratava de ciúmes (pela empresa não ter reconhecido capacidade em nenhum de nós para assumir a produção tendo que trazer alguém de fora), mesmo não gostando dele trabalhamos durante um ano e meio numa boa, respeitando-o normalmente, por ser adepto ao “diálogo”, gostava de ficar horas entre a gente proseando.

Mas como na vida nem tudo são flores, apareceram quatro peças para serem produzidas tipo exportação, mais do que empenho precisava muito conhecimento e prática para fazê-las e isso de alguma forma ele não tinha, ficou nítida a sua fisionomia de preocupação quando chegou o projeto, no seu antigo emprego não chegou a desenvolver um desse calibre, o dono visando a grana que ia entrar exigiu de todos muita concentração e disposição.

Como bom “loroteiro” com um tapinha nas costas acalmou o patrão e disse estar tudo em plena ordem, seriam entregues na data marcada no contrato, reuniu todos os funcionários da produção (uns quinze) e comunicou sobre a situação e que precisava da contribuição de todos, já tínhamos experiência e sabíamos exatamente como deveria ser os procedimentos necessários para a construções destas peças, coisa que ele claramente não sabia, e o pior é que o nervosismo com a sua insipiência deixava muito transparente.

Agora de proseador, virava um ditador, nos consumia em horas de trabalho, em fins de semana, não aceitava um conselho, não aceitava ser corrigido, sua arrogância diante da conjuntura nos tornava pobres ignorantes, com o patrão ficava em reuniões inúteis, enquanto nós ralávamos para desenvolvermos as peças, ele sabia que quem realmente estava tocando o projeto éramos nós, porém não dava o braço a torcer.

Estava tão cheio de si, que chegava a estacionar o seu carro nas vagas destinadas as chefias lá de cima, até foi repreendido sobre isso, contudo com aquele “papinho” enrolava numa boa e relevavam, só lembravam para nunca estacionar nas vagas destinadas ao dono e o de sua mãe, correndo o risco de ter o seu contrato rescindido, “malandro” foi advertido mais uma vez ao estacionar exatamente na área proibida, como já sabíamos da sua advertência bastava ele pisar na bola mais uma vez e o seu destino seria a rua.

Para aliviar a pressão descarregava sobre nós os seus gritos, alguns até não muito interessantes de serem reproduzidos, aquilo a cada dia acumulava-se dentro de nós, o problema era a tal data para ser cumprida o que impedia de fazermos algo contra, esperamos mais de um mês para vermos o trabalho pronto, inúmeras horas extras transformadas em banco de horas (Como pode um governo aceitar esse tipo de acordo prejudicando o trabalhador???), horas que poderiam ser um dinheiro a mais no nosso bolso.

Foi elogiado por todos quando as “benditas” saíram da fábrica rumo a Europa, seu sorriso alcançava orelha a orelha, o "EU" inundava a sua boca (dizem até que recebeu um aumento), aliviado pelo sucesso, a sua velha conversa fiada voltava, agora era hora de agir e deixamos para colocar o plano em prática numa sexta-feira.

E Deus quis que realmente fosse aquele dia, bem cedo como de costume estacionou o seu carro em uma vaga imprópria, não havia motivo melhor para avançar com o nosso plano. Precisando sair com uns grandes da fábrica, só voltaria pela hora do almoço, o patrão ainda não tinha chegado e a produção estava tranquila, num esforço descomunal levantamos o seu carro e colocamos atravessado justamente sobre as duas principais vagas, o do dono e o da mãe do dono, e normalmente voltamos ao trabalho, quarenta minutos depois se ouviram gritos na sala do “homem”, queria falar imediatamente com o dono do carro e pelo corredor veio a sua sala deixando poeira no ar.

Perguntou desesperadamente por ele, respondemos que havia saído com os supervisores, retornou batendo o pé entrando direto na sala do RH, daqui de baixo escutou a sua voz:

- “Prepara a rescisão de contrato agora do encarregado da produção”

- “Qual o problema”?

- “Você não entendeu? Estou mandando preparar a rescisão do contrato, ou quer ir junto com ele”?

Em cinco minutos o papel ficou pronto e trouxeram a sua sala, apenas aguardando a sua assinatura, ao voltar o “boa prosa” ficou surpreso com aquilo em cima de sua mesa e rapidamente subiu na sala do RH, que o indicaram conversar com o patrão, não durou dez minutos a conversa, sem entender nada e sem poder se defender retornou direto para a sua sala, arrumou as suas coisas e foi embora, nem nos cumprimentou em sua despedida. No sábado o churrascão pegou fogo na casa do Dito com direito a muita cerveja e som de Bezerra da Silva:

“...otário é um bicho safado, é mesmo uma praga ruim, que nasce no mundo inteiro, e destrói tudo igual a cupim...”

Regor Illesac
Enviado por Regor Illesac em 14/07/2009
Código do texto: T1698329
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