BANDEIRA: O POETA DO ALUMBRAMENTO!
Manuel Carneiro de Souza Bandeira teve a sua vida pautada pela constatação da tuberculose e de todos os males e temores, produzidos pela doença em um homem regido pela era vitoriana do início do século XX. Bandeira vai além da doença! Vai além do susto! Vai além da escrita! Vai além do Poeta! Se posta com consciência, diante de todo o problema da sua doença, da sua existência, e, apesar de tudo não vive em um mundo só seu, ele não deixa de fora da sua obra literária tudo o que acontece na vida publica do Brasil.
Bandeira escreve um poema sobre a notícia fatídica transmitida pelo médico sobre a sua saúde:
Pneumotórax
Febre, hemoptise, dispnéia e suores noturnos.
A vida inteira que podia ter sido e que não foi.
Tosse, tosse, tosse.
Mandou chamar o médico:
— Diga trinta e três.
— Trinta e três . . . trinta e três . . . trinta e três . . .
— O senhor tem uma escavação no pulmão esquerdo e o pulmão direito infiltrado.
— Então, doutor, não é possível tentar o pneumotórax?
— Não. A única coisa a fazer é tocar um tango argentino.
Escreve criticas literária, crônicas, ensaios, poesias e traduz obras literárias, observando com cuidado e muito profissionalismo, o trabalho na língua original do escritor sobre a obra a ser traduzida por ele.
A polêmica sobre: “Os Sapos”, poema declamado por Ronald de Carvalho durante a Semana de Arte Moderna de 1922, evento este em que Bandeira não participa o coloca em uma posição difícil diante dos parnasianos, entre eles, um em especial, Olavo Bilac, em que tem a sua obra “Via Láctea” , ridicularizada por Bandeira.
Sonhei que me esperavas. E, sonhando,
Saí, ansioso por te ver: corria...
E tudo, ao ver-me tão depressa andando,
soube logo o lugar para onde eu ia.
E tudo me falou, tudo! Escutando
Meus passos, através da ramaria,
Dos despertados pássaros o bando:
"Vai mais depressa! Parabéns!" dizia.
Disse o luar: "Espera! que eu te sigo:
Quero também beijar as faces dela!"
E disse o aroma: "Vai que eu vou contigo!"
E cheguei. E, ao chegar, disse uma estrela:
"Como és feliz! como és feliz, amigo,
Que de tão perto vais ouvi-la e vê-la!”
Manuel Bandeira joga com as palavras à maneira dos parnasianos, colocando pontos essenciais e características importantes defendidas e cultuadas por eles; isto é: sonoridade, métrica regular, mas ele na verdade não concordava com a ferocidade das críticas feitas aos parnasianos. Ressalto neste ponto tão controverso na sua vida, que o poeta passeava pelo parnasianismo em suas poesias, com desenvoltura.
Enfunando os papos,
Saem da penumbra,
Aos pulos, os sapos.
A luz os deslumbra.
Em ronco que aterra,
Berra o sapo-boi:
- "Meu pai foi à guerra!"
- "Não foi!" - "Foi!" - "Não foi!".
O sapo-tanoeiro,
Parnasiano aguado,
Diz: - "Meu cancioneiro
É bem martelado.
Vede como primo
Em comer os hiatos!
Que arte! E nunca rimo
Os termos cognatos.
O meu verso é bom
Frumento sem joio.
Faço rimas com
Consoantes de apoio.
Vai por cinqüenta anos
Que lhes dei a norma:
Reduzi sem danos
As fôrmas a forma.
Clame a saparia
Em críticas céticas:
Não há mais poesia,
Mas há artes poéticas..."
Urra o sapo-boi:
- "Meu pai foi rei!"- "Foi!"
- "Não foi!" - "Foi!" - "Não foi!".
Brada em um assomo
O sapo-tanoeiro:
- A grande arte é como
Lavor de joalheiro.
Ou bem de estatuário.
Tudo quanto é belo,
Tudo quanto é vário,
Canta no martelo".
Outros, sapos-pipas
(Um mal em si cabe),
Falam pelas tripas,
- "Sei!" - "Não sabe!" - "Sabe!".
Longe dessa grita,
Lá onde mais densa
A noite infinita
Veste a sombra imensa;
Lá, fugido ao mundo,
Sem glória, sem fé,
No perau profundo
E solitário, é
Que soluças tu,
Transido de frio,
Sapo-cururu
Da beira do rio...
A sua obra poética passeia pelas escolas clássicas, tais como; romantismo, parnasianismo, simbolismo, modernismo e concretismo. Davi Arrigucci Junior um estudioso da obra literária de Bandeira, mostra que o poeta teve uma longa pratica no parnasianismo e simbolismo e abriu a poesia brasileira para os versos livres, além de poetar e estar na vanguarda na década de 50 com o concretismo.
Durante o seu tratamento contra a tuberculose morre em 1916, sua mãe; em 1918, sua irmã; e em 1920 morre seu pai, o escritor para escapar da solidão conhece outros escritores e poetas, e dessa maneira se fundamenta grandes amizades, entre elas a de Mário de Andrade, Sérgio Buarque de Hollanda, Jaime Ovalle, Menotti Del Picchia e Oswald de Andrade. Depois de corresponder e ser incentivado por Mário de Andrade publica poemas e crônicas falando da sua vida desde a sua infância em Recife até a sua vida adulta a maioria das suas publicações foi custeada por ele.
Para espantar o medo e a doença lia muito e guardava em seu inconsciente. E escrevia para transmitir as suas memórias. Vivia com intensidade cada dia da vida. O alumbramento para Bandeira pode ser sentido na leitura dos seus poemas. Sua obra é completa e envolve inspiração, mas também muito trabalho.