VONTADE DE PARTIR…

Desde há alguns anos, que por volta desta altura me dá uma enorme vontade de partir, de viajar, de deixar tudo para trás, de cortar quase todos os laços emocionais e tecnológicos do meu dia a dia, de me desprender de tudo, de me entregar a uma simplicidade que é minha, mas que aqui na minha cidade, no meu mundo, não consigo levar à prática por inúmeros condicionalismos da mais variada ordem, sendo que essa simplicidade assumida passa apenas pelo plano espiritual, ou se quiserem, pela minha interioridade…

Essa vontade de partir é facilitada pelas férias já marcadas e que faço desde 2004 na comunidade de Taizé, uma espécie de convento a céu aberto em pleno campo a 400 km de Paris, mas onde a religião não é imposta e os deveres e obrigações são mínimos, bem como as regras, sendo que é o melhor local que conheço para a reflexão de que estou a precisar…

Lá tudo é simples, desde a comida aos alojamentos, uma simplicidade que me falta e que lá me completa, sendo que lá é o local onde me sinto mais perto do meu Deus, pelo silêncio do campo, pela simpatia das pessoas, porque há sempre alguém disponível para se falar nas 3 línguas nas quais me consigo exprimir e fazer-me entender…

Ainda por cima este ano está a ser particularmente intenso e eu tenho de tomar algumas decisões bastante importantes no que toca à minha vida nos próximos tempos, decisões que provavelmente marcarão a minha vida nos anos que se seguem, decisões impossíveis de tomar neste ruído civilizacional no qual me vejo rodeado, em cafés a tomar com os amigos, em noitadas a fazer para espairecer e pelo meu gosto natural de me divertir, em textos e poemas que sou incapaz de parar de gerar, na minha ligação umbilical à Internet e aos vastos meios de comunicação que tenho a meu dispor…

Em Taizé tudo é diferente, e é a ausência desta sociedade tecnológica que me faz falta, numa relação de amor-ódio nunca bem assumida…

E das coisas que eu mais gosto de fazer é em silêncio à noite observar o céu com as estrelas que amo e reflectir, pensar, nas pessoas que amo e de, nesse simples e imaculado acto, de reafirmar os laços perenes que me unem a essas pessoas.

É só uma semana, mas parece mais, parece que o tempo mente e quando volto parece que passou um mês, e às vezes quase um ano, e sempre que de lá venho, venho um homem diferente, diferente para melhor…

E apesar de faltar um mês, já tenho o fundamental preparado: a banda sonora especial, e que ficará durante anos na memória, a ouvir durante os 1500 km que me separam da pequena aldeia francesa, o caderninho especial para certos apontamentos, a lista de lembranças para oferecer, as camisolas a usar, que são sempre as mais expressivas que façam sorrir ou reflectir as pessoas de diferentes línguas quando as observam, a lista de coisas em que pensar, os meus amuletos de fé, e sobretudo levo comigo essa vontade de deixar tudo para trás, essa vontade de me fazer um homem novo, essa vontade de partir…

Miguel Patrício Gomes
Enviado por Miguel Patrício Gomes em 10/07/2009
Código do texto: T1691897
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