PERIGOS DO MOCINHO
Num dos capítulos da novela “A Favorita” houve uma cena em que o “mocinho” se encontrava no elevador de uma obra, em vias de despencar (o elevador, não a obra, por enquanto). Ele olha temeroso para os lados. Será que vai se estrepar? Final do capítulo. No capítulo do dia seguinte repete-se a cena e o espectador nota com alívio que o mocinho se jogou numa das lajes antes do incidente acontecer.
Coincidência ou não, isso lembra os antigos seriados da matinê dos domingos. Eram divididos em 12 ou 15 capítulos, de uns 20 minutos cada, com cenas de ação constante, culminando com o famoso “perigo do mocinho”. O mocinho caiu no despenhadeiro; o mocinho se encontra amarrado diante de uma gigante serra elétrica que irá dividi-lo em duas partes; o mocinho caiu numa cova cheia de animais selvagens... A gente estava careca de saber que o mocinho sempre encontrava um jeito de se safar, só ficava curioso para saber como. As aventuras desses heróis de celulóide enchiam simbolicamente de emoções nossa vidinha pacata e eram imitadas nas brincadeiras de “camone” (corruptela da expressão “come on”, pronunciada com a arma apontada para o oponente).
Os seriados exploravam toda espécie de gênero: faroeste, espionagem, ficção científica, aventuras nas selvas; era ação constante, tiros, explosões, agressões. Os protagonistas não precisavam ser artistas, muitos mal abriam a boca; de preferência, que fossem atletas.
Não havia sutilezas, dava de reconhecer os bandidos logo de cara pela expressão e pelos gestos, com exceção do misterioso “chefão”, que deveria ficar incógnito até o final da série. A excitação era grande nos capítulos finais: desmascarado, o bandidão era perseguido pelo mocinho. O cinema quase vinha abaixo, gritos, assobios, cadeiras sacudidas. Também não havia cenas amorosas, o mocinho tinha mais intimidade com seu cavalo do que com a própria namorada. Isso, aliás, devia ser debitado ao rigoroso código de ética vigente naqueles tempos.
Os atuais cineastas e novelistas certamente aprenderam muito com os velhos e ingênuos seriados. O suspense ao final de cada capítulo, as cenas de perigo, as perseguições e explosões. Filmes como os de James Bond, Indiana Jones e outros, no fundo, não passam de “seriadões” com maior tecnologia. Será que as emoções continuam as mesmas?