As quatro estações
Na estação de Parada Inglesa eles se encontraram pela primeira vez. E aos poucos foi brotando verde - tempo de esperança - da semente que ela julgava já estéril. Enquanto o aguardava nos dias seguintes, o ar explodia em cheiros e cores - ou era sua alma que finalmente coloria e perfumava? Desabrochavam dias e noites indistintos, na ânsia do próximo encontro. Desta vez, a primavera não traria praga.
De repente em Vergueiro ela se deu conta da mudança de estação. Eram par, pois uma só andorinha não faz verão. O coração enfim gozava merecidas férias da solidão em longos dias, longos encontros, longas despedidas. E eram ondas de calor que nada dava alento, um aquecimento global. Foi aí que vieram os primeiros desentendimentos, fugazes como chuvas de verão - tempos quentes.
Um dia na estação de Osasco o tempo virou, sombrio e tormentoso como as águas de março. Seria fim de linha? Mas então os ânimos abrandaram e ela pôde saborear frutos gostosos num tempo de grandes colheitas. Dias e noites voltaram a ter a mesma duração e o cair das folhas das árvores trouxe aconchego e uma certa melancolia, memórias de outras estações.
Na estação do Ipiranga ela não o encontrou no local marcado e os dias brancos de outono deram lugar à cinzitude. Tentou se acalmar: devia ser uma queda súbita de temperatura, uma hibernação passageira. Com o passar do tempo e sucessivos desencontros, percebeu que ele aos poucos migrava para locais mais quentes, como fazem os pássaros. E seus dias foram ficando cada vez mais curtos e gélidos: mudanças climáticas bruscas sempre a atordoaram. Tudo à sua volta era ventoso, escuro - tempo de recolhimento. E ela se agasalhou do passado, para suportar a súbita inversão térmica.
Por fim, veio-lhe à lembrança Cecília Meireles " Aprendi, com a primavera a me deixar cortar. E voltar sempre inteira".
Partiu para a próxima estação.
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Este texto faz parte do Exercício Criativo - As Quatro Estações
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