Pensamentos sobre versos alheios
Façamos um trato
Companheira
Você sabe que pode contar comigo
Não até dois nem até dez
Mas contar comigo
Tenho uma pasta em meu computador onde guardo coisas que me interessam e que penso podem servir um dia para que eu escreva alguma coisa que preste. Ou não. Isto é, que eu escreva ou não alguma coisa que preste ou não. Tanto pode ser uma coisa como outra. Variações. Escrever algo que preste. Escrever algo que não preste. Ou não escrever.
Assim guardei esses versos do poeta uruguaio Mário Benedetti que morreu aos 88 anos no último mês de maio. Não conheço a obra e dele só não desconhecia o nome e a nacionalidade, sei lá por que. Mas esses versos mexeram comigo.
Vejam, é um trato. Ou seja, um acordo. Acordos são feitos entre partes. Pressupõe-se que existem direitos e deveres a serem cumpridos pelas partes. Significa que existem sanções que deverão ser aplicadas a parte que não cumprir os itens do acordo. Mas esse é um acordo diferente. Um trato sui generis. A parte proponente é a única a ter deveres e a outra parte cabe apenas gozar dos direitos. Quem propõe quer apenas que quem recebe a proposta saiba que ele estará sempre ali ao alcance de suas mãos, dos seus olhos ou voz, pronto para o que der e vier.
Mas que trato é esse que não passa de uma única afirmação? Companheira, você sabe que pode contar comigo, não até dois nem até dez. Mas contar comigo. Ele não pede. Apenas diz: Você pode contar comigo. Contar comigo. Pode se ter mil leituras desse texto porque diversos são os olhos e os corações que o lêem. Mas não se pode escapar da única verdade: Você pode contar comigo. E eu fico aqui pensando se existe alguém no mundo que pode dizer isso de coração aberto, incondicionalmente. E eu fico aqui pensando se eu seria capaz de fazer esta proposta. E fico também pensando qual o sentimento capaz de gerar essa proposta. Será o amor? Será a amizade? Não sei. Hoje meu pensamento está indo só até aqui. Depois eu penso mais.