Assassinato social

Eu como uma reles estudante secundarista, ando sempre sem grana e de transporte publico, o qual eu chamo carinhosamente de busão .

O ônibus já me rendeu muitos escritos e, em geral , as pessoas que andam nele são minha fonte de inspiração com suas conversas, fofocas, gestos e atitudes. Sob as quatro rodas de um ônibus, e depois da catraca acontecem muitas coisas, mais hoje minha atenção se deteve com uma coisa que aconteceu fora deste pequeno universo, uma coisa que pude espiar de mansinho pelas janelas embaçadas de um dia de inverno .

Estava eu cansada , jogada no banco do ônibus, olhando pela janela, como quem volta de campo de trabalho forçado (o qual nós chamamos de escola) quando, derepente, vi uma coisa se mexendo, a principio parecia ser um cachorro ou algo assim, mais conforme este se mexia, uma manta caiu, deixando a mostra um corpo de uma mulher, apenas coberto por alguns trapos, esta “pessoa” gesticulava freneticamente e soltava sons que pareciam ser mais grunhidos do que palavras, quando duas coisas magricelas, de barrigas inchadas e a mostra apareceram e sentaram no chão, ou melhor na terra úmida de baixo do viaduto, estes três seres que pareciam mais animais do que pessoas, devoravam alguma coisa que não pude reconhecer, e quando acabaram, ate as migalhas que ficam do papel foram lambidas por um destes.

Olhando para tudo isso uma sensação de tristeza, repugna e indignação me inundou, fazendo pensar no ponto em que chegamos, no caos em que vivemos, em meio ao transito, ao barulho das buzinas e na displicência de todos na busca diária pelo sucesso, tão apressados que passamos desapercebidos por essa cena, de assassinato, sim assassinato social e moral, nós com nossas mochilas e nossa pressa nem nos damos conta daquela pobre senhora de cabelos crespos e das duas crianças magricelas cobertas de farrapos, em pelo mês de junho; talvez esse inverno eles sobrevivam e consigam alguma coisa para saciar sua fome, mais quem sabe o que os espera, assim, nós vivemos em meio a um comercio indireto de carne e vida humana.

E eu continuava no ônibus indignada, perplexa e impotente, mais o sinal abre, os carros andam, e tudo volta ao normal, e eu também volto a seguir minha vida, como se essa cena tivesse ficado num passado muito distante, em algum lugar da minha imaginação, um lugar a qual eu dou o nome de Brasil.

deh valente
Enviado por deh valente em 28/06/2009
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