Um encontro com a luz
Agora me sinto embrião, só não sei ao certo se ainda estou no útero materno ou se fui arrancado de lá por vontade de minha mãe. Olho essas paredes sem vida, úmidas, escuras e a impressão que tenho é que elas fecham-se a cada dia. Sinto-me sufocado. A porta está à minha frente. Olho-a e percebo que sou prisioneiro. Ela está sem tranca, mas eu estou trancado.
Pego novamente o papel e a pena e tento recomeçar meus escritos. Rabisco, desenho, mas novamente as lágrimas caem por sobre o papel e mancham o que exprimo de mim mesmo, mancham a secreção de sentimentos que consegui extrair de minha alma. Abandono, mais uma vez, o papel.
De onde nasce tanta lágrima? Será que tal fonte não pode gerar também vida?
E essas roupas pesadas que tentam proteger esse depósito de morte? Quisera livrar-me de tudo o que me tapa a visão, que me separa de algo puro que ainda não conheço.
Sentado nesse banco olho essa luz que adentra esse antro de desolação. Ela penetra vagarosamente, cautelosamente, como o bem pisando em terreno amaldiçoado, como a vida rasgando a carne materna para soltar seu grito.
Essa luz travando guerra contra as trevas enraizadas em mim, arranca-me por um segundo desse abismo de sofrimento e abaixo novamente a cabeça para derramar mais pranto. Mas o pranto já é outro, a fonte agora gera, se não a vida, pelo menos uma vontade exacerbada de encontra-la.
Hei de encontra-la, vida. Hei de fazê-la renascer nessa alma cansada das dores do mundo, nessa alma cansada das mazelas humanas. Hei de encontra-la, vida. Hei de agarrar-me a ti e a ti doar-me em total entrega.
Deus? Podes perdoar a minha dor?