Texto para um dia de traição.

Texto para um dia de traição.

Alexandre Menezes

Pediu-me uma corda, queria morrer enforcado, me empenhei em convencê-lo a substituir por um sino de estridente badalo que estava guardado no escuro porão. Balançou a cabeça contrariado, preferiu seguir com um palavrão engasgado, o que menos queria era chamar atenção. Segui seu caminho bastante preocupado, o amigo acabara de ser outra vez enganado, e falou que viver perdera a razão.

Parecia que desta vez ele tinha importado, por tantas vezes tinha sido humilhado, e nunca fora registrada sequer uma única reclamação. Antes, ao descobrir, apenas ficava calado, sempre preferiu abafar os freqüentes casos, a perder sua grande paixão. Perguntava-se todo o tempo onde tinha falhado, mesmo com o rosto ainda molhado, comprava flores e dedicava em cartão.

Vi o amigo num banco sentado, envergonhado com minhas palavras, sentei ao seu lado e pela nossa amizade apertei sua mão. Olhou nos meus olhos bastante desconfiado, falou dos sentimentos que foram despedaçados e que não sabia como não havia morrido do coração. Agradeceu por ter um amigo para consolá-lo e, para equiparar aos chifres que havia levado, dispensava o sino e me pediu um carrilhão.