O INOCENTE

O INOCENTE

Aquela ligação que Carlos recebeu logo pela manhã, o deixou atordoado pelo restante do dia, quando chegou em casa a mulher pergunta:

- Nossa Carlos que cara de enterro é essa, até parece que morreu alguém! – E de fato ocorreu uma morte naquele dia, sua mãe, morreu de um câncer que vinha lutando contra há anos. Carlos não era um filho muito bom, desde que sua mãe ficou doente nunca foi visitá-la. Mesmo assim a amava muito e ela sabia do seu amor, e também sabia que Carlos era um homem muito ocupado, e que não podia dar toda atenção a ela.

Com o passar do tempo, Carlos só tinha cabeça para o trabalho, era a única coisa que realmente gostava de fazer, tinha perdido todo o gosto pela vida depois que o seu grande amor, sua prima Íris casou-se com o seu melhor amigo, agora pior inimigo Beni. Carlos não tinha vida, trabalhava de noite e de dia, perdeu toda a passionalidade com a perda de Íris.

É bem verdade que Carlos também era casado, mas o fez por pura vingança, não amava, sequer gostava de Mara, coitada, era uma ótima esposa, dedicada até demais.

O que afligira Carlos naquele dia não era bem a morte de sua mãe, até porque para ele, ela já tinha morrido há muito tempo, mas era a ligação que recebeu.

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Era raro Carlos receber ligações em sua sala, principalmente no horário do expediente:

- Alô.

Carlos reconheceu na hora, era a voz doce de Íris sua prima. Infelizmente trazia a má notícia de sua mãe:

- Carlos, é a Íris. Infelizmente sua mãe morreu nessa madrugada... – Carlos quase nem ouviu a notícia, estava a essa altura pálido. Depois de tantos anos ainda era forte seu amor por Íris. Carlos tirou do fundo do peito uma frieza quase insana, mas não disfarçou seu contentamento em ouvir aquela voz:

- É.....é....você pode me passar o endereço do velório?

No velório, ao ver sua mãe daquela maneira, Carlos se debruçou num pranto interno que nem ele entendia, era uma mistura de remorso por ele e alivio por ela.

Íris também estava lá, linda como nuca. Cabelos longos, pele cor de sonho, sobrancelhas grossas, uma boca farta de carnes e de dar água na boca. Nesse dia, Íris olhava de um jeito muito diferente para Carlos, o que nele causou certo tipo de confusão.

Dois dias depois toca o telefone da sala de Carlos, e novamente ele reconheceu a doce voz de Íris:

- Carlos, eu tenho uma coisa pra te contar, na verdade são duas.

- Pode falar. – Inesperadamente ele ouviu:

- Carlos eu te amo. – Nessa hora Carlos ficou completamente imóvel, sem fala.

Carlos não esperava nem em seus mais lindos sonhos que um dia isso aconteceria, mas aconteceu. – Mas não posso ficar com você. – Numa revolta demente Carlos respondeu:

- Então porque me procura, eu preferia não saber que você me ama. – Depois numa calma divina. – Eu também te amo Íris, sempre te amei, mas porque só agora você me procura?

- Só agora me deu coragem de te dizer.

- Você pode me encontrar hoje, num bar que tem na avenida principal?

- Posso.

Encontro marcado e Carlos nem se lembrou que nesse dia era aniversário de Mara, mas para ele não importava, sempre fazia serão, e claro nesse dia seria mais daqueles intermináveis serões.

Mara nunca se importava que Carlos fizesse seus serões, ela era uma ótima esposa, porém nos dias que Carlos trabalhava até mais tarde tinha suas distrações:

- Alô, é a Mara.

- Quantas vezes eu já disse pra você não ligar aqui?

- É que meu marido vai fazer outro serão hoje.

- Tudo bem, no mesmo lugar?

- No mesmo lugar.

Todas as noites de serão de Carlos, Mara encontrava-se com seu amante, um homem muito mais feio que Carlos, porém comparecia. Carlos nem sonhava que sua mulher o traia.

Os serões de Carlos eram todos para fugir do seu lar, mas ele realmente trabalhava, naquela noite Carlos não ia trabalhar pela primeira vez.

Íris estava ansiosa para o encontro. Carlos já não se continha. Tudo isso enquanto Mara e seu amante, já estavam quase no ápice da paixão adúltera, pois ambos eram casados e não podiam estender a noite toda.

Carlos não parava de olhar para Íris, estavam ali a quase meia hora e não trocaram nem meia palavra. Íris quebra o silêncio:

- Carlos, me diz uma coisa, porque você se casou com Mara?

- Por vingança, por pura vingança.

- Saiba Carlos que eu te amo, mas não poso ficar com você.

- Por quê?

- Porque eu sou casada e você também, e eu não sou capaz de trair ninguém. – Aquela frase o deixará extasiado, pois no fundo ele sabia das qualidades de Íris, não pensou duas vezes e disse de supetão:

- E se eu me separar de Mara, podemos nos casar. – O olhar de Íris brilhou, e ela olhou no relógio:

- Preciso ir.

- Tudo bem.

- Até outra hora, eu te ligo com certeza.

Carlos trabalhou tanto durante tantos anos que tinha um pé-de-meia guardado. Claro que ninguém sabia da existência da sua mini fortuna, pelo menos era o que ele imaginava.

Os encontros com Íris começaram a ficar bem freqüentes, mas nunca ousou nada além de pegar na sua mão. Enquanto Mara se deleitava com seu amante. Estava tudo indo muito bem quando aconteceu o inesperado. Um dia, Íris chegou para Carlos e disse:

- Vou me separa de Beni.

- Ora, ora, já era tempo. Posso saber por quê?

- Ele está me traindo; com a Mara. – Carlos ficou inesperadamente com raiva, e depois o alivio:

- Menos mal, assim eu também me separo.

Separaram, namoraram, noivaram. Tudo como manda o figurino.

No esperado dia do seu casamento com Íris, a surpresa, ela não apareceu. Carlos ficou esperando na igreja, viu com ódio nos olhos todos os convidados indo embora com cara de pena, o padre com mais pena ainda:

- Meu filho é melhor você ir embora também, esse tipo de coisa é normal acontecer.

- Normal pro senhor que ama alguém que nem sabe se existe. – Carlos blasfemou, mas porque estava com raiva, e com raiva foi embora.

Quando Carlos abriu a porta de sua casa outra surpresa, não havia sequer o tapete da porta. O primeiro pensamento que teve era o de assalto. Correu para o porão, onde escondia sua mini fortuna, e encontrou apenas um bilhete “Querido Carlos, minhas sinceras desculpas, mas você é muito inocente, e você sabe né, o mundo é dos espertos, e com certeza e muito trabalho você conseguirá tudo novamente. Assinado Íris, Beni e Mara”

Renann Calazans
Enviado por Renann Calazans em 24/06/2009
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