Miséria
Eu viajo por todo país, e as vezes me pergunto: Onde está a miséria do mundo?
Por todas as cidades por onde passei se exceção nenhuma existe miséria, pessoas morando na rua, se remoendo de frio durante a noite, crianças fazendo malabares nos faróis, limpando vidro, vendendo chicletes, pessoas gritam no trem vendendo amendoim, chocolate, de repente entra um homem alto e forte, empurrando uma cadeira de rodas, com um rapaz de cadeira de rodas, ele sofreu de paralisia infantil e não conseguiu desenvolver as pernas, ele pede esmola. O homem forte espera em um canto do trem enquanto o homem empurra sua cadeira de rodas recolhendo o dinheiro das pessoas do trem. Eu me pergunto, Por que aquele homem do trem está empurrando uma cadeira as onze da manhã? Os dois descem do trem rapidamente, e entram em outro.
Esse tipo de cena se repete todos os dias em todo o nosso país.
Passamos por dezenas, as vezes até centenas de pessoas todos os dias, vemos essas e muitas outras cenas todos os dias da nossa vida, virou rotina, ver criança morrendo de fome, trabalhando como adulto para se auto-sustentar pessoas morrendo de frio. Esses dias estava andando no centro do Rio, quando olhei para uma calçada, tinha um cara ensanguentado na calçada, ele estava acordado e sentado, cobrindo os ferimentos com jornal. Eu parei e olhei a cena. Nunca sei o que fazer quando isso acontece, pensei em chamar uma ambulância, fazer alguma coisa. Mas eu não fiz nada. Por que? Perguntei-me depois, na verdade sinto medo, medo de assumir a responsabilidade de ajudar o outro.
Nesse dia eu descobri onde está a miséria do povo.
A nossa miséria está exatamente no fato de não fazer nada, de passar desapercebido pelas coisas, como se simplesmente não fosse a gente, para não parar e olhar, esquecemos como nos colocamos no lugar do outro, esquecemos que alguém um dia disse que somo todos irmãos, vejo pessoas vestidas de terno com uma bíblia debaixo do braço que passa indiferente a todas essas coisas, julga o outro, diz que é a vontade de Deus, e não faz nada, as mães passam correndo com seus filhos perto dessas crianças por medo, esquecem que poderá ser o filho dela, nós passamos por isso todo dia, mas estamos sempre atrasados e sem tempo para olhar e talvez dizer: “Você não é isso, não precisa ficar assim, levanta e anda, você é um universo de possibilidades”.
É disso que essas pessoas precisam, alguém que lhes traga para a realidade, alguém que abra seus olhos, diga que não se resume apenas aquilo em que se transformou, as pessoas não são estáticas elas podem mudar. Nós podemos mudar, podemos mudar até o mundo se assim desejarmos, mas sozinho eu sou apenas um floco de neve em meio ao oceano, sozinha consigo mudar apenas meu pequeno mundo, mas juntos, podemos ir muito, muito longe.
Sabe onde está a miséria humana?
Está em achar que dando uma moeda tudo se resolve.
Está em achar que só existe seu pequeno mundo, seu trabalho, sua família, seu filhinho querido.
Está em não ver que existe mais, em viver como um zumbi que não enxerga quem passa ao seu lado na rua.
Está em ter medo de ajudar e de seguir em frente. É ai que está a nossa miséria, na isenção total de responsabilidade com o mundo a nossa volta, isso em todos os sentidos possíveis e imagináveis.