SIMONAL - NINGUÉM SABE O DURO QUE DEI (O FILME)


Vou dedicar mais um texto a Wilson Simonal, que considero ter sido um dos maiores cantores do Brasil. O primeiro que escrevi sobre ele foi feito antes que assistisse ao filme-documentário que dá título a esta crônica.
 
            Agora que já o assisti posso fazer um breve complemento. O filme mostra que sua principal finalidade é mesmo tentar resgatar a imagem de Simonal através das declarações dos convidados especiais, como Pelé, Paulo Moura, Ziraldo, Chico Anysio, Artur da Távola, Sabá, Tony Tornado, Castrinho, Nelson Motta, Sérgio Cabral, além de sua segunda mulher e seus dois filhos, entre outros.
 
            Tem o mérito de não omitir os fatos que levaram o cantor a ser totalmente rechaçado pelos seus pares artistas, além de odiado pelo público, que lhe aplicou solene vaia no Teatro Opinião, do Rio de Janeiro, logo após o jornal “O Pasquim” começar a publicar artigos e charges contra ele. Algumas dessas charges são mostradas no transcorrer do filme. Fica bem evidente que o Pasquim teve participação direta na execração de Wilson Simonal, o que é confirmado discretamente pelo próprio Ziraldo, que fazia parte da equipe do jornal. Outro que era do Pasquim, Jaguar, também participa do documentário, mas, além de rir à toa, só fala bobagens totalmente dispensáveis.
 
            Um dos pontos altos é quando interpreta a canção “The Shadow of your Smile”, juntamente com Sarah Vaughan, a diva do jazz, quando esta esteve no Brasil. Um momento e um arranjo antológicos.
 
Por 90 minutos o filme flui de uma maneira gostosa de assistir e pode-se dizer que foi muitíssimo bem editado. Mostra toda a ascensão do cantor que chegou a reger, segundo dito no documentário, mais de 30.000 vozes no Maracanãzinho. Um verdadeiro espetáculo. E, segundo Tony Tornado, foi aí que começou a inveja e perseguição a ele.
 
            A entrevista feita em 2005 com seu ex-contador Raphael Viviani em São Paulo, pivô de toda a desgraça de Simonal até o fim de sua vida, é marcada pela emoção do entrevistado e pelo que se ouve de sua mulher (que não aparece): “depois de 34 anos vocês vão mexer com isso de novo?”. Percebe-se nitidamente que Raphael em nenhum momento fica à vontade e sente-se extremamente mal ao falar e recordar dos fatos acontecidos na época. Ele garante que foi preso e torturado por agentes do terrível DOPS (Departamento de Ordem Política e Social) a mando de Simonal. Afirma também que só confessou os desfalques (que, segundo ele, não ocorreram) depois que os agentes do DOPS disseram que iriam “mexer” com sua família, num puro ato de terror. Raphael havia sido acusado por Simonal de praticar desfalques semanais a ele e ao conjunto Som Três que o acompanhava frequentemente. Sabá, que era o contrabaixista do Som Três, diz, com expressão abatida, não acreditar que Simonal fosse capaz de uma atitude dessas.
 
            Os convidados especiais dão declarações todas elas favoráveis ao cantor. Nelson Motta, porém, afirma que Simonal era mesmo muito pedante e arrogante, o que pode ter complicado ainda mais a sua situação com declarações do tipo: “Sou amigo dos ‘homens’ sim, e daí? Liga aí pro Ministro”. E ele era assim mesmo.
 
            O filme termina mostrando melancolicamente em uma foto, a agonia de Simonal perante a morte, deitado em uma cama de hospital olhando fixo para a câmera. Causa da morte: problemas com o fígado causados pela bebida, associado à profunda depressão.
 
            Recomendo que assistam ao filme e tirem suas conclusões, mesmo depois das recentes declarações do compositor Paulo Vanzolini, afirmando que Simonal era mesmo um dedo duro. Com vocês.
 
         Ao final, já fora da sala de projeção, ouvi casualmente o seguinte comentário de uma pessoa que também havia assistido ao filme: “Quanta saudade que dá!”. E mesmo com toda a polêmica em torno do assunto, deu saudade mesmo. Quem, como eu, viveu naquela época certamente irá entender. Como diz o título da música de Pena Branca e Xavantinho e que Simonal gravou: “A Saudade Mata a Gente”.
 
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