Nem cliente ou muito menos paciente
Nem cliente ou muito menos paciente.
Alexandre Menezes
Passei uma tarde inteira tentando entender se a relação médico X paciente ainda existe. Eu e minha namorada utilizamos serviços, antes chamados tratamentos médicos, de uma das clínicas neurológicas mais conceituadas de Brasília. Nosso promotor de vendas, antes Dr. Médico, judeu, é renomado em sua especialidade e integra o corpo clínico, de uma também renomada, no Brasil e no mundo, instituição batizada em homenagem a um físico e cientista .
Após 03 anos sem encontrar solução para suas dores de cabeça constantes, ela procurou um profissional indicado por amigos que passou a atendê-la e, posteriormente ,a mim também. Mesmo com vários itens, para nós necessários, não sendo oferecidos aos usuários de plano de saúde, coisa de grife famosa, ficamos felizes: afinal suas dores sumiram e eu passei a dormir melhor. Fieis ficamos. Marcávamos os atendimentos e esperávamos o encontro com o sorridente promotor de serviços. Só nos últimos 3 meses consumimos mais de 4 mil reais mesmo utilizando excelentes planos de saúde.
De repente: dores de cabeça e 11:00 foi o horário encaixado. Para isso, ela que trabalha pela manhã, fez arranjos para iniciar sua jornada após consulta e exames. Preocupada com suas tarefas, resolveu chegar alguns minutos antes na intenção de um possível atendimento antecipado e pela primeira vez foi sozinha. Eu, gestor de uma empresa pública, pedi que informasse que, na minha chegada, pagaria pelos serviços. Atrasaria de 15 a 20 minutos devido ao trânsito e uma reunião de trabalho.
Já no caminho, sua pálida voz me informou que apenas começaria os exames e seria consultada mediante pagamento mesmo com a enorme dor de cabeça que teve início na noite passada. Pedi para que fosse embora e procurasse outro local. Ela, talvez por desespero, preferiu engolir o orgulho ao recordar que já havia sido atendida em quase todas as clínicas especializadas do Distrito Federal. Mesmo chateado, aceitei suas justificativas e por hoje me calei. Ele me ouvirá.
Confesso que a falta de ética nem me assusta ou surpreende mais. Pior é perceber que, com a extinção do paciente, resta apenas sermos frágeis clientes de serviços necessários oferecidos por profissionais que ,muitas vezes julgando superiores a Deus e aos códigos, desprezam a importância da boa relação com seus consumidores: isso sim me preocupa. Na mesma hora senti saudade dos doutores do mundo: o porteiro do prédio, o frentista, a vendedora, o cabeleireiro, o garçom, o jardineiro, ... que por tantas vezes escutam minhas loucuras, pensamentos e problemas, como se um paciente eu fosse, e fazem minha cara amarela sentir um pouco mais importante mesmo referendada, ou não, por um cartão platinado.